quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Cuba no JN



O Jornal Nacional exibiu nesta semana uma série sobre Cuba. A jornalista Morroni fez as reportagens. Na minha opinião os jornalistas devem ter toda a liberdade de mostrar a realidade seja qual for, e fazer as críticas que acham pertinentes. A questão que se coloca é por que não mostram outras faces deste interessante país que, quando comparados a outros países são indicadores favoráveis a Cuba, como por exemplo a saúde de qualidade, universal e gratuíta. Da mesma forma a educação, inclusive formando em cursos como medicina, estudantes de diversos países pobres.

Mas, parece evidente que há uma intenção de somente mostrar o aspecto negativo, porque se mostrar os positivos a população vai ver Cuba com outro sentimento. Ao proceder assim, se empobrece o jornalismo e a liberdade de expressão tão cara ao próprio jornalismo. Em um dia desses, a jornalista Morroni se referiu ao alto escalão do governo cubano como sendo de uma elite cheia de privilégios, lembrei de um professor da UFPel que passou um tempo por lá e foi jantar na casa de um ministro, era uma casa simples, tipo de cohab, com um cardápio semelhante ao da maioria do povo, ele nos contou emocionado. Pena que a jornalista não viu coisas desse tipo.

Demilson F. Fortes



quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

O álcool nos estádios é retrocesso

Retrocesso

Infelizmente, o relator da Lei Geral da Copa do Mundo propõe liberar bebida alcoólica nos estádios de futebol, para a Copa e nos jogos do futebol brasileiro. Para isso propõe alteração do Estatuto do Torcedor, que atualmente proíbe. O Congresso poderia ter um momento de sensatez e não aprovar a proposta. Será um retrocesso.

Quem acompanha futebol ou vai ao estádio, sabe que é melhor para a sociedade a proibição do álcool naquele ambiente. Hoje, o sentimento é de tranquilidade, nota-se a presença de famílias inteiras, pai ou mãe levando suas crianças, senhoras e senhores de todas as idades, cada vez mais mulheres presentes. O álcool, como regra, tende a tornar os ânimos alterados e as coisas mais fáceis. Acredito que os estádios estão melhor sem bebidas alcoólicas. O Brasil se libertou do FMI, mas agora se torna subordinado a FIFA, que coisa lamentável.
Demilson Fortes

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

É preciso dizer não

É preciso dizer não. E, é preciso mudar a vida.

O programa Globo Reporter, da sexta-feira, é sobre as 16 usinas hidrelétricas que estão planejadas para serem construídas na Amazônia. Importante mostrar ao país, neste momento, os planos energéticos e seus impactos socioambientais. É necessário a sociedade saber sobre as perdas previstas em floresta e biodiversidade, causadas pela inundação. Alguns impactos serão posteriores, muitos ainda não previstos. É certo que as cidades no entorno crescerão, com mais população se terá maior pressão sobre a floresta.

 A informação e o debate é fundamental. Todos (as) brasileiros (as) devem devem ter conhecimento sobre o que acontece em seu país, e deveriam ser chamados a decidir sobre questões do presente e do futuro. Deveriam saber que existem formas alternativas de energia que deveriam ter mais investimentos. Mas, penso que é importante dizer claramente, que não basta ser contra a construção de usinas para evitar impactos (desastres) desse tipo. É preciso muito mais: alterar hábitos, cortar consumo de energia, mudar o modo de vida. Aí está "a questão". Todos (as) quererem o conforto e querem continuar consumindo muito, sendo assim, mesmo as fontes alternativas serão insuficientes, e continuaremos perdendo florestas, terras férteis, culturas e biodiversidade. Enfim, como ouvi ontem o espanhol Francisco Garrido dizer "estamos comendo o futuro".
Demilson F. Fortes
Porto Alegre, RS.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Para pensar: "estamos comendo o futuro"

O Prof. Francisco Garrido Peña, da Universidade de Jaen, Espanha, na sua palestra, hoje à tarde, no Seminário de Agroecologia, falando sobre o modelo de produção e consumo definiu assim o comportamento da sociedade atual: "estamos comendo o futuro". Disse que é preciso desconstruir os mitos da economia de eficiência, competitividade e produtividade, pois estes, estão cheios de ideologia e de componentes éticos deste modelo em crise. Para ele, o conceito de cidadania deve ser social e ambiental, não individualista. (religación).

Garrido, afirmou que o PIB é um indicador cego e grosseiro, que é preciso novos parâmetros, que valorize a felicidade. Defendeu fomentar as instituições cooperativas frente as competitivas; fomentar os estímulos qualitativos frente aos quantitativos; fomentar a democracia cooperativa e deliberativa. Para Garrido, precisamos superar a "democracia de mercado", superar este "modelo de consumo". Reafirmou que a agricultura ecológica é mais eficiente em produção e em diversidade, se comparada à convencional.

Apresentou o seguinte resumo do paradoxo  relacionado a pobres e ricos,  dos seus impactos e vulnerabilidades ambientais:

1. Quanto maior a renda, maior o impacto ecológico;
2. Quanto menor a renda, menor o impacto ecológico;
3. Para os de maior renda, é menor a vulnerabilidade ecológica;
4. Para os de menor renda, maior é a vulnerabilidade ecológica.

"se não há equilíbrio, não há desenvolvimento".
"a crise da Europa não se resolve mudando de partidos políticos, tem que trocar o modelo".

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Os riscos aos pedestres



A lateral de uma ponte de concreto desabou em São Paulo. O desmoronamento ocorreu de noite, felizmente, ninguém se feriu. Se tivesse acontecido de dia, as pessoas que transitam pela lateral da ponte, poderiam sofrer acidente. Esse caso deve servir de alerta. O que ocorreu foi que a estrutura de concreto não teve manutenção, sofrendo infiltração, enferrujando, que comprometeu a estrutura. Acabou caindo de podre. Lembrei das marquises dos prédios nas cidades, sob as quais milhares de pessoas transitam, todos dos dias. Se não há manutenção e fiscalização, o risco existe.

Demilson Fortes

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Empresas sem responsabilidade

 
Uma reportagem no Bom Dia Rio Grande/RBS mostrou um exemplo de descaso ambiental, e a relação disso com a saúde humana. Produtos químicos tóxicos, que eram usados para tratamento de postes (1960-2005) foram abandonados num antigo depósito. Os indicadores de saúde revelam maior incidência de câncer no bairro onde se localiza o depósito, no Município de Triunfo/RS. As empresas "responsáveis" pelo produto são AES-SUL e CEE. Ou melhor dizendo: as empresas "irresponsáveis" são AES-SUL e CEE. O depósito fica na beira do rio, imaginem o impacto na água, no solo, na biodiversidade. O Ministério Público  entrou com  pedido de liminar para remoção do material. Segundo a matéria, o custo da operação de retirada, por empresa especializada, é de 30 milhões de reais, .
Demilson Fortes


terça-feira, 22 de novembro de 2011

Crescimento e Decrescimento

Debate no facebook.

Postagem de Emir Sader:
Quem prega o "decrescimento" deve estar contente. A Europa ja decresce. E quem paga o preço mais caro sao os mais pobres.

Postagem de Demilson Fortes:
É uma colocação - e provocação - interessante Emir Sader. De fato, somente parar de crescer não basta. Por outro lado, somente crescer não basta também. E, mais ainda: como imaginar crescer o consumo infinitamente em um planeta finito com recursos naturais limitados? Como crescer sem limite em um planeta de leis ecológicas de auto-dependência sistêmica sem consequências? O aquecimento global está aí. A China cresce e milhões de pobres têm acesso a direitos importantes, entretanto, gera milhares de milionários que querem sair da China pela poluição que os pobres e os trabalhadores vão sentir e pagar, pois alguém sempre paga a conta ambiental. É um debate sério e complexo, onde a demagogia e o simplismo não colaboram. De minha, parte, como ecologista de esquerda, profundamente influenciado pelo marxismo - heterodoxo -, penso que, temos uma luta de classes em curso, pois quem mais consome e faz do planeta um lixo são os ricos. Penso também que para se ter um mundo melhor não se faz com posições anarquistas, nem liberais. É necessário enfrentar e superar o capitalismo, com ele não temos futuro coletivo. Ontem numa palestra com Serge Latouche, perguntei sobre Cuba, ele falou que Cuba apresenta ótimos indicadores de desenvolvimento humano com menores impactos ambientais (pegada ecológica). Eis aí, uma questão interessante, novamente Cuba, sinalizando que "outro mundo é possível". Este é um bom e necessário debate. Sobre a Europa atual falta de crescimento fez eles guinarem à direita, nos indicando que, posições simplistas de somente não crescer não nos basta. Defendo o ecossocialismo para um mundo de todos, do presente e para os que virão. A possível saída  - ou a saída possível - é o encontro do mundo do trabalho com a ecologia.

Porto Alegre, 22 de novembro de 2011.

domingo, 20 de novembro de 2011

sobre vídeo na rede


Infelizmente, está circulando na internet, um vídeo chamado "Belo Monte, quem manda no Brasil?", que tenta fazer uma crítica ao vídeo do movimento Gota D'água, em que artistas se posicionam contra a construção da usina Belo Monte.

Assisti e considero o tipo de material sem consistência, de baixo nível, feito para confundir, com inverdades, apostando no senso comum. Não se propõe ao debate sério, não apresenta argumentos para a sociedade estar melhor informada. Utiliza-se, do mesmo argumento do Aldo Rebelo, caso do código florestal, de um nacionalismo militarizado, que nessas horas aparece. Aldo Rebelo, como da mesma forma o vídeo, acusa estrangeiros e as ONGs de querer entregar a "nossa" Amazônia.

Por essa justificativa, então, se é brasileiro está autorizado a destruir a floresta, e foi o que Aldo Rebelo, de forma criminosa, fez no seu relatório. Não são capazes de enfrentar o debate dos impactos dessa opção de desenvolvimento, seja feito por brasileiros ou não. Os mesmos argumentos foram usados quando o Brasil demarcou as terras indígenas da Reserva Raposa do Sol, em Roraima, do progresso e do nacionalismo.

Esse é um debate sério sobre desenvolvimento e sustentabilidade, sobre o presente e futuro, e do compromisso com as futuras gerações. É ótimo que aconteça o debate, e todo (a) brasileiro (a) opine, mas sem os maniqueísmos e valores da era da ditadura militar. A causa ambiental e a causa dos trabalharores é internacional, e todos (as) são bem vindos (as).

Demilson Figueiró Fortes
Porto Alegre, RS.




sexta-feira, 18 de novembro de 2011

As corporações derrotam Obama


O poder das corporações

Um projeto que pretendia garantir uma alimentação mais saudável nas escolas do EUA, do Presidente Barack Obama, foi derrotado, por influência do poderoso lobby da indústria. O projeto previa restrições de alguns componentes como açúcar, gordura e sal que, comprovadamente, causam muitos problemas de saúde.

Nos EUA, como em muitos países, a obesidade já é uma epidemia, crescendo a cada ano. Além das perdas humanas, isso impacta o custo da saúde, que fica mais cara. A sociedade sempre acaba pagando. Os números do crescimento no PIB de alguns setores iludem, pois na contabilidade final, causam mais prejuízos do que ganhos ao país.

Aqui no Brasil, as corporações do tabaco, bebidas e outros setores empresariais financiam campanhas e sustentam empresas de comunicação. Nos EUA, como no Brasil, o sistema das corporações fragilizam a democracia e dificultam avanços básicos, como deter, por exemplo, a obesidade e males causados pelo tabaco e pela bebida.

Demilson F. Fortes

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A Espanha decadente


Que decadência da Espanha. O país está mergulhado numa crise socioeconômica aguda. Nos últimos meses, em meio à crise, protestos levaram milhares de pessoas às ruas, que se declaram o "movimento dos indignados". O paradoxo é que estes protestos contribuirão para colocar o país novamente sob governo conservador, do Partido Popular (PP), ideologicamente de direita, que por ter nos seus fundamentos o compromisso com setores de direita, vai tentar sair da crise com políticas neoliberais, de austeridade econômica e de natureza antissocial.

Com a direita retornado ao poder, novamente os ricos estarão protegidos e o capitalismo espanhol tentará novo fôlego. Este paradoxo deve provocar crise existencial nos indignados das ruas, que por protestarem contra a política mas não apresentarem força alternativa capaz de aglutinar um bloco de poder, estão contribuindo para a direita voltar ao governo.

Infelizmente, como podemos ver, pessoas nas ruas, mesmo que indignadas, se não assumirem a política como necessária e se não compreenderem as disputas que estão no cenário, poderão não ser a garantia que as coisas serão melhores, mas, pelo contrário, corre-se o risco das coisas serem ainda piores. Bom exemplo para pensar a realidade brasileira, onde a extrema esquerda anda com discurso afinado com a direita.

Demilson F. Fortes


sábado, 12 de novembro de 2011

Mujica



Trecho do discurso do Presidente do Uruguai, José Mujica, na Assembleia Legislativa no RS, dia 08/11/2011:

 " (...) somos um bicho gregário, necessitamos da sociedade. Temos que ser solidários por necessidade antropológica, porque não sabemos viver solitários, como os felinos. E, neste pêndulo entre egoísmo natural e solidariedade natural, se constrói a História. E, se move a história humana (...) .


terça-feira, 8 de novembro de 2011

Os milionários da China

 
No Programa Bom Dia Brasil, de hoje, reportagem sobre os milionários chineses que não querem mais morar no seu país. O crescimento da economia de estilo capitalista está possibilitando que muitas pessoas enriquecerem por lá. Assim, a China está cheia de milionários. Como justificativa para querer morar em outro país estão: liberdade, educação, saúde, e a poluição. Ocorre que, em algumas cidades chinesas o ar é insuportável, parecendo a revolução industrial inglesa, quando descobriu o carvão. 
O interessante da reportagem da Globo, é que os jornalistas - às vezes tão críticos - não são capazes de nessas horas fazer algumas considerações críticas sobre isso, apenas noticiam que os milionários buscam coisas melhores lá fora. Poderia ter uma análise mais completa, por exemplo, da relação da fortuna dos milionários com a situação ambiental da China. Mas a mídia tem dificuldade de fazer crítica ao capitalismo enquanto  sistema,  que enriquece alguns explorando o trabalho alheio, e da mesma forma, se utilizando dos recursos naturais e do meio ambiente até o seu esgotamento e ou degradação. Aí notamos que falta a real liberdade de imprensa aos jornalistas.
A verdade provável, é de que, estes milionários que querem "ar puro" em outro país, possivelmente enriqueceram ou estão com "negócios" que poluem e ou destroem ecossistemas, causando sérias consequências à saúde pública e a qualidade de vida da maioria das pessoas, principalmente as mais pobres, que não podem fugir da poluição.
A boa vida dos milionários na China está relacionada a existência da dura realidade dos trabalhadores que, do lado oposto da opulência, têm baixos salários, e  muitas vezes, péssimas condições de vida, lutando permanentemente pela sobrevivência, e também, da degradação ambiental, frequentemente  e amplamente divulgada. Para existir milionários na China, e no mundo todo, sempre há quem trabalhe e há quem pague pelos danos ambientais, alguns desses acertos de conta virão no futuro. O que se faz atualmente é,  simplesmente, transferir a dívida aos que virão.
Podemos concluir que os burgueses são todos iguais desde que surgiram, acumulam para si a riqueza material e transferem  para os outros - socializam com a coletividade - os problemas, principalmente os sociais e ambientais. Velho capitalismo de sempre, até na China dita comunista.
Demilson F. Fortes
Porto Alegre, dia 08 de novembro de 2011.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Texto de Boaventura de Souza Santos


PRIMEIRA CARTAS ÀS ESQUERDAS
 
Boaventura de Souza Santos

Não questiono que exista um futuro para as esquerdas, mas seu futuro não será uma continuação linear de seu passado. Definir o que têm em comum equivale a responder a pergunta: " Que é a esquerda?". A esquerda é um conjunto de posições políticas que compartilham o ideal de que todos os seres humanos têm todos o mesmo valor e que são o valor mais alto. Este ideal é posto em questão sempre que há relacões sociais de poder desiguais, isto é, de dominação. Neste caso, alguns indivíduos ou grupos satisfazem algumas de suas necessidades tranformando a outros indivíduos ou grupos em meios para seus fins. O capitalismo não é a única fonte de dominação, mas é uma fonte importante.
 
As diferentes compreensões deste ideal produziram diversas fraturas. As principais foram respostas opostas às seguintes perguntas: o capitalismo pode ser reformado para melhorar a sorte dos dominados ou isto só é possível fora do capitalismo? A luta social deve ser conduzida por uma classe (a classe operária) ou por diferentes classes e grupos sociais? Deve ser conduzida dentro das instituições democráticas ou fora delas? O Estado é, em si mesmo, uma relação de dominação ou pode ser mobilizado para combater as relações de dominação?
 
As respostas opostas a estas perguntas estiveram na origem de violentas fraturas. Em nome da esquerda se cometeram atrocidades contra a esquerda; mas, em seu conjunto, as esquerdas dominaram o século XX (apesar do nazismo, do fascismo e do colonialismo) e o mundo se tornou mais livre e igualitaário graças a elas. O breve século das esquerdas terminou com a queda do Muro de Berlim. Os últimos trinta anos foram marcados, por um lado, pela gestão de ruínas e de inércias e, por outro, pela emergência de novas lutas contra a dominação, com outros atoters e outras linguagens que as esquerdas não puderam entender.

Enquanto isso, liberado das esquerdas, o capitalismo voltou a mostrar sua vocação antissocial. Agora volta a ser urgente reconstruir as esquerdas para evitar a barbárie. Como recomeçar? Com a aceitação das seguintes ideias:

Primeiro, o mundo se diversificou e a diversidade se instalou no interior de cada país. A compreensão do mundo é muito mais ampla que a compreensão ocidental do mundo; não há internacionalismo sem interculturalismo.
 
Segundo, o capitalismo concebe a democracia como um instrumento de acumulação; se é preciso, a reduz a irrelevância e, se encontra outro instrumento mais eficiente, prescinde dela (o caso da China). A defesa da democracia de alta intensidade deve ser a grande bandeira das esquerdas.
 
Terceiro, o capitalismo é amoral e não entende o conceito de dignidade huamana; defender esta dignidade é uma luta contra o capitalismo e nunca com o capitalismo (no capitalismo, inclusive as esmolas só existem como como relações públicas).

Quarto, a experiência do mundo mostra que há imensas realidades no capitalismo, guiadas pela reciprocidade e o cooperativismo, a espera de serem valorizadas como o futuro dentro do presente.

Quinto, o século passado revelou que a relação dos seres humanos com a natureza é uma relação de dominação contra a qual temos que lutar; o crescimento econômico não é infinito.

Sexto, a propriedade privada só é um bem social se é uma entre várias formas de propriedade e se todas estão protegidas; há bens comuns da humanidade (como a água e o ar).

Sétimo, o breve século das esquerdas foi suficiente para criar um espírito igualitário entre os seres humanos que aparece em todas as pesquisas; este é um patrimônio das esquerdas que elas estão dilapidando.

Oitavo, o capitalismo precisa de outras formas de dominação para florecer, do racismo ao sexismo e a guerra, e todas devem ser combatidas.

Nono, o Estado é um animal estranho, metade anjo e metade monstro, mas sem ele muitos outros monstros andariam soltos, insaciáveis, à casa dos anjos indefesos. Melhor Estado, sempre; menos Estado, nunca.

Com estas ideias, as esquerdas seguirão sendo várias, ainda que já não seja provável que se matem umas as outras e é possível que se unam para deter a barbárie que se aproxima.

Boaventura de Souza Santos, sociólogo e professor universitário. É um dos maiores nomes da esquerda mundial, conhedor da realidade brasileira  e mantém  boas e próximas relações com o Partido dos Trabalhadores. 

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Agronomia, minha profissão.



Hoje, dia 12 de outubro, celebra-se o dia do Engenheiro Agrônomo, profissão que escolhi e que gosto muito. Eu, fiz o curso na Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel (UFPEL). A opção pela agronomia, foi das melhores escolhas que fiz na vida, pois tenho satisfação no que faço, isso é importante na vida, termos gosto pelo nosso trabalho. E, desde antes de entrar na agronomia, na escola técnica que estudei, aliei a agricultura com a ecologia, união necessária e cheia de beleza. Sou um agrônomo que acredita que o "agri" fica sempre melhor com "cultura" e desenvolvimento fica melhor associado ao "sustentável", que alia o produtivo ao social, ambiental e cultural. Não sou dos que resumem o rural a ideia de negócios, pois penso que seria empobrecê-lo demais. O mundo rural é plural, carregado de cultura e de diversidade. Como profissional acredito que temos compromisso ético com as pessoas, que habitam no campo e cidade, e da mesma forma com o presente e o futuro, pois temos vinculos com produção da alimentação e do manejo dos recursos naturais. Neste dia do Agrônomo, minha profissão, portanto, meu dia, reafirmo o que tenho feito sempre, de fazer uma agronomia sintonizada com a agroecologia e com o desenvolvimento rural sustentável. 

Demilson F. Fortes
12 de outubro de 2012.


terça-feira, 11 de outubro de 2011

Tudo é finito

Nossa perspectiva utópica é de uma sociedade socialista libertária. Nesta, é irrenunciável a democracia e as liberdades. Para nós, o socialismo será democrático ou não será. Nesta sociedade utópica, é imprescindível o cuidado pelos ecossistemas, pois destes depende a base de sustentação para viver-se em mundo habitável. Terá adiantado pouco milhões lutarem tanto em todos os tempos pela igualdade social, para a humanidade socialista herdar um mundo ecologicamente degradado e despedaçando-se. A luta contra o capitalismo também é a luta ambientalista. Não tem futuro para a humanidade manter um sistema que estimula um padrão de vida com consumo e economia de crescimento infinitos. Tudo é finito. Tudo, inclusive o capitalismo.

Demilson F. Fortes
Porto Alegre, 11 de outubro de 2011.

sábado, 1 de outubro de 2011

O bairrismo


O bairrismo preconceituoso faz mal ao Rio Grande.

O patrono do acampamento Farroupilha, escritor Alcy Cheuiche, com seu conhecimento e sabedoria, diz sempre, que é brasileiro, ou um gaúcho brasileiro. Coloca que o farrapo Bento e seus líderes, sempre deixaram bem claro que eram brasileiros. Alcy diz ainda, que somente reconhece o movimento farroupilha como nosso e importante, porque foi feita por gaúchos brasileiros que lutavam por ideais, queriam um país que os incluísse, queriam participar como protagonistas e não periféricos, queriam seus pleitos reconhecidos. 

Estou com Alcy Cheuiche, sou brasileiro e gaúcho, ou um gaúcho brasileiro. 

Recentemente foi feita uma comparação de como seria o peso do RS no mundo se este fosse um país: seria do tamanho do Gabão, um país africano que poucos conhecem e não tem peso nenhum. Frequentemente se ouve por aí e por aqui, alguns bairristas - e preconceituosos - que ficam se achando melhor que os outros brasileiros, desconhecendo a sua própria história e sem senso de medida, que possa os situar no mundo. 

O Brasil é rico e diverso, em gente e cultura, em natureza. Isso, associado a outros aspectos o faz grande, posição que nos coloca na responsabilidade geopolítica de contribuir para um mundo melhor, mais solidário, mais pacífico, mais alegre, de democracia, direitos, ecologicamente sustentável e socialmente justo. Fiquei orgulhoso da Presidente Dilma na abertura da Assembleia da ONU, mostrou nossa soberania, e que, nossa grandeza deverá ser colocada pela coletividade planetária, como por exemplo na defesa da Palestina.

O bairrismo está quase sempre associado ao preconceito e a ignorância. De minha parte, irei sempre combater. Tenho orgulho de ser brasileiro, amo meu país. E, sou gaúcho, que por destino, é nascido em vinte de setembro.

Demilson Figueiró Fortes
Porto Alegre, outubro  2011.



quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Dia mundial sem carro

Dia mundial sem carro

O dia 22 de setembro é o dia mundial sem carro. Este é um movimento que iniciou há alguns anos na Europa e foi se espalhando pelo mundo. Embora seja ainda de pouco impacto, contribui para alertar e conscientizar sociedade e governos para o problema do trânsito e sobre alternativas sustentáveis.

Infelizmente, a maioria das pessoas pensa que haveria espaço para todo mundo ter seu carro. Imaginem o planeta com 7 bilhões de carros; inviável; loucura. Bem antes disso já haverá colapso. Se prevalecer o carro e o individualismo, no balanço final, coletivamente todos perdemos, somente ganham as fábricas e os vendedores, que buscam seus lucros. 
A saída é mudar a matriz do pensamento: prioridade ao transporte público, logística que não priorize colocar muitos caminhões nas ruas, cadeias produtivas mais curtas, comércio local com menos deslocamentos, bicicletas, carros com mais pessoas por veículo. Andar a pé, coisa que muitas pessoas não querem fazer, mesmo que em pequenos trajetos.

Enfim, o que precisamos é um novo modo de vida, em que cada um pode e deve fazer a sua parte no processo. Cada atitude de consumo ou de deslocamento causa impacto no todo. Somos um sistema.
 
Em cidades como Londres já há o pedágio urbano, política para inibir a circulação de carros em determinados locais. Esse será um caminho para todas as grandes cidades. O transporte individual é mais petróleo que causa efeito estufa e alterações climáticas, ou, os agrocombustíveis (biodiesel e álcool), que se colocam como opção energética, porém, usando usando terras para obter este tipo de energia significa menos área para o plantio de espécies utilizadas para alimentação, ou terras que poderiam estar ecologicamente preservadas como locais de preservação de biodiversidade e de proteção de mananciais de água. O biodiesel e o álcool não representam saídas ecológicas, mas são paliativos, que com o tempo devem ser superados também.
 
Para pensar as cidades e o planeta em bases sustentáveis, o que precisamos é defender o transporte público, de qualidade e eficiente. Aqui em Porto Alegre, por exemplo, tem muito que melhorar, começando pelas paradas de ônibus que não podem deixar as pessoas desabrigadas, ao relento, realidade atual em muitos lugares. Ter opções de horários, pontualidade, e informações disponíveis sobre o sistema todo. Defendo que o transporte coletivo seja subsidiado e o individual taxado, pois somente assim teremos condições de fazer uma transformação de efeito.
 
Outra iniciativa necessária é o incentivo ao uso de bicicletas, com ciclovias seguras e locais para estacioná-las, parte que os empresários do comércio poderiam fazer e ainda não estão fazendo.

Hoje, dia 22 de setembro, um dia para reflexão e ação. Pode ser o início de alguma ação, sair da inércia. O nosso mundo poderá se melhor ou pior, e todos somos responsáveis para onde iremos. É claro, que uns tem maior poder que outros, como por exemplo, os governos, os empresários e os ricos, que podem dar maior contribuição, pois as comunidades mais pobres já são vítimas de tudo, inclusive, no trânsito, das longas esperas do transporte coletivo público em paradas muitas vezes com exposição ao frio ou calor, chuva, etc.
E, para lembrar: a fumaça dos carros, entra pelos nossos pulmões impactando o organismo todo. Há pesquisas em São Paulo, por exemplo, que é significativo as internações por doenças da poluição, principalmente crianças. Os estudos mostram que são grandes os gastos com saúde pública para enfermidades causadas pela poluição e pelos acidentes de trânsito. É preciso alterar isso.

Demilson Fortes
Porto Alegre, 22 de setembro de 2011.
 
 

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Análise do Código Florestal aprovado





Análise do Projeto do Código Florestal, Emenda Substitutiva Global de Plenário Nº 186, aprovado na Câmara dos Deputados em 24/05/2011 (PL Nº 1.876 de 1999 e apensados)



Introdução

O presente documento apresenta uma análise sobre o texto do Código Florestal aprovado no dia 24 de maio de 2011 na Câmara dos Deputados. Certamente, pela repercussão e consequências, um dia para ficar na história do Brasil, e pode-se dizer, com vencedores e vencidos. Desde o início estava claro que a disputa que se configurou, entre agricultura e meio ambiente, iria gerar muito debate e conflito. Ao final confirmou-se a previsão.

O setor agrícola colocou o tema em pauta, defendendo a necessidade de uma reformulação do Código florestal. É também este setor da economia brasileira, até o momento, o mais beneficiado com o resultado deste debate. Para ser ilustrativo, pode-se dizer que na disputa entre a lavoura de soja e a Mata Atlântica, a primeira teve a preferência dos deputados federais. Na política o símbolo que ficará é, provavelmente, o da bancada ruralista (a velha UDR) gritando de forma entusiasmada o nome do relator, deputado Aldo Rebelo do PCdoB, saudando-o como herói do grupo.

Lamentavelmente, a preservação ambiental, a precaução, a visão de longo prazo, ou mesmo a simples conservação de áreas com manejo sustentável foi vista, por setores da economia, especialmente o agronegócio, como empecilho para o crescimento do país. O Partido dos Trabalhadores, mesmo com algumas visões diferenciadas internamente, tentou de forma insistente introduzir mudanças no texto do relator, buscando melhorá-lo, visando dar garantias à produção sem fragilizar a proteção ambiental, o Partido, entre outros, disse não a anistia para os crimes ambientais.

O texto agora tramita no Senado, onde o debate continua e será aprofundado, depois retornará a Câmara, para posteriormente ir à sanção da Presidente Dilma que já anunciou que irá trabalhar para melhorar o conteúdo da lei, não aceitando a ideia de entrar para a história como o governo que autorizou retrocessos ambientais no país.


Elementos gerais

Na metade de 2010 o deputado Aldo Rebelo apresentou o seu relatório do Projeto de Lei Nº 1.876/1999. Por entender que a proposta significava, na menor das hipóteses, um enorme retrocesso sócio-ambiental, o PT votou contra o relatório na Comissão Especial que analisou o projeto. Nos meses seguintes o Partido dos Trabalhadores continuou tentando alterar vários pontos do projeto, chegando em alguns momentos a obter avanços na negociação, muitos deles revertidos pelos ruralistas e pelo relator. No último dia 24 de maio de 2011, depois de muitas controvérsias, uma nova versão foi apresentada pelo relator. Esta versão (emenda 186) é a que foi levada ao plenário da Câmara Federal, votada e aprovada por 410 votos sim e 63 votos não. Apesar do encaminhamento para votação favorável, o Líder da Bancada no último momento liberou o voto dos Deputados do PT e assim, dos 63 votos não, 35 deles foram de deputados do PT. Este resultado não foi surpresa pois antes mesmo da votação em plenário, na reunião interna, a bancada do PT definiu por 27 votos a 24 a favor da orientação do governo, o que sinalizava a divisão interna. Já na votação da Emenda 164 o resultado foi de 182 votos contrários e 272 votos favoráveis, e desta vez a Bancada do PT não teve dúvidas, votou maciçamente contra.

Por sua importância estratégica, o texto do Código Florestal, deve ser analisado numa perspectiva para além de alguns setores econômicos. É equivocado, por exemplo, considerá-lo somente do ponto de vista da agricultura, mesmo que seja da agricultura familiar. Por isso, ao ser analisado globalmente, o Projeto de Lei aprovado na Câmara Federal é um enorme retrocesso. O país perderá muito em áreas de preservação e biodiversidade, portanto, perde-se muito sob todos os pontos de vista. Infelizmente os interesses imediatos saíram vencedores, qualquer analise de médio e longo prazo apontará muitos prejuízos para a sociedade brasileira como um todo.

Do ponto de vista da diminuição das emissões de gases de efeito estufa para o cumprimento das metas estabelecidas, o Governo Federal terá que readequar a sua estratégia para cumprir o compromisso internacional assumido.

Nesse enfrentamento, a agricultura, como atividade econômica e produtiva, obteve a maior vantagem. Os segmentos sociais da agricultura familiar e os médios produtores obtiveram vantagens. Entretanto, a ampla vantagem, é dos chamados ruralistas que são os grandes vitoriosos nesse embate histórico.

Muitos elementos podem ser trazidos para ilustrar o debate. Por exemplo, em relação às atividades agropecuárias realizadas no Pantanal, o relatório de 2010 era mais restritivo. O texto aprovado do Novo Código permite a exploração, “desde que seja sustentável e com recomendação técnica da pesquisa”. Retórica pois o texto também permite a “supressão da vegetação nativa para outros usos” sujeitos a permissão do órgão estadual. Como o Centro-Oeste possui perfil de grandes propriedades, onde se concentram altos índices de crimes ambientais, esta mudança é plenamente favorável à estes comportamentos predadores.

A emenda 164 é mais um exemplo. Apresentada pelo deputado Paulo Piau (PMDB-MG), substituta do Artigo 8º, na prática, libera todas as atividades realizadas atualmente nas Áreas de Preservação Permanente (APPs), pois flexibiliza a intervenção ou supressão de vegetação nessas áreas. Ou seja, de acordo com o texto aprovado, as atividades produtivas nas APPS são consideradas como áreas consolidadas e poderão ser mantidas, independente de tamanho de área, de condição socioeconômica, de estudos de Zoneamento Ecológico-Econômico, do CONAMA, enfim, o texto apenas remete as situações ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), que poderá ser elaborado pelos órgãos estaduais, muitas vezes, mais flexíveis.

Outro fato relevante, é que foi retirado da versão final do relatório um aspecto importante que constava na versão de 2010, o Art. 47, o qual estabelecia uma moratória de cinco anos para desmatamentos. Esta medida era muito importante, contribuiria para frear a escalada de desmatamentos e ajudaria o país no cumprimento das metas da Política Nacional de Mudanças do Clima para redução das emissões de gases de efeito estufa. Esta moratória permitiria ao Estado elaborar o Zoneamento Ecológico-Econômico, a elaboração de planos de bacia, o que daria condições técnico-científicas para orientar a ocupação de territórios. Em síntese, pode-se concluir que os interesses locais e da agricultura estão acima do conjunto dos interesses do País.

Desde 2009, a agricultura familiar vinha dialogando com o Governo Federal buscando garantir no texto exceções favoráveis. No entanto, o relator sempre demonstrou resistência. As propostas apresentadas pelo Governo Dilma também nunca foram divulgadas oficialmente, vinham à público apenas noticias jornalísticas que tornavam públicas alguns elementos das negociações. Em determinados momentos tinha-se avanços, posteriormente recuos. O auge foi no dia 10 de maio quando o texto estava para ser votado e foi interrompida a votação ao se constatar que o relator tinha acrescentado modificações de última hora ao texto, substituindo, entre outras coisas, a palavra “recomposição” por “regularização”, o que alterava profundamente o conteúdo do documento.

No dia 24 de maio, num último esforço para melhorar minimamente o texto do código florestal, o PT apresentou quatro destaques para votação, retirando um deles posteriormente e os outros três foram derrotados. Um dos destaques propunha suprimir o § 5º do Art. 33 da Emenda Substitutiva 186, que concede a anistia das dívidas. Outro, propunha a supressão do inciso IV do § 5º do Art. 38, que autoriza a compra de terras para compensação, o que, no entendimento do PT, da forma como está proposto contribui para concentrar a propriedade rural em níveis maiores que os atuais. E o terceiro destaque, foi no Art. 50, propondo que as áreas preservadas por determinação legal, em propriedades da agricultura familiar fossem consideradas como serviço ambiental.


O Agronegócio e o Código Florestal

A vitória ruralista é política e ideológica. Conseguiram fragmentar a base de sustentação do governo Dilma e derrotaram o governo. Ao prevalecer o texto do Aldo Rebelo e ser aprovado com divisão do PT, e ao impor a emenda 164, os ruralistas mostraram força política. Vão querer impor outras coisas no futuro, a ANVISA, por exemplo, que enfrenta questões polêmicas (fumo e agrotóxicos), já está na mira. A Presidente Dilma ou vetará os abusos ou passará os próximos anos dando explicações. O tema ambiental já pautou o debate eleitoral em 2010 e tudo indica que não será diferente nos próximos anos.

A vitória ruralista é também materialmente de enorme significado econômico, senão vejamos um resumo das razões para as comemorações:

• Conseguiram anistia de dívidas para os crimes ambientais relacionadas a Reserva Legal (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APP) praticados até 22 de julho de 2008. Isso, entre outros, contraria a Constituição Federal que estabelece no Art. 225 § 3° “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Este perdão de dívidas fica condicionado a realização da regularização ambiental, como consta no Art. 33 § 5º e Art. 34 do texto.

• No Art. 16 está garantido que será admitido o cômputo da APP com RL, o que na prática diminui área de preservação total. Se, por exemplo, um produtor tinha que deixar 100 hectares de APP e outros 100 hectares de Reserva Legal, agora ficará obrigado com apenas metade disso, pois ambas serão somadas.

• Conseguiram garantir no Art. 13 § 7º que propriedades de até quatro módulos fiscais (pode chegar a 400 hectares no Mato Grosso, por exemplo) mantenham somente a Reserva Legal existente, ou melhor, o que restou dela. Se tiver alguma reserva fica como está, se desmatou não precisa recuperar. Significa que independentemente de ser agricultura familiar ou chácara de final de semana, ou empresário rural, não precisará recompor a Reserva Legal. Para ilustrar, imagine-se, em alguns municípios do Mato Grosso onde o módulo fiscal é de 100 ha, uma propriedade de 400 ha onde foi totalmente retirada a floresta (ilegalmente) e plantado soja - comum da região -, agora, de acordo com o texto aprovado ficará sem a obrigação de recompor 320 ha de floresta (na Amazônia a Reserva Legal é 80% da área), ou seja, se não tiver nada de APP na área, este produtor continuará cultivando os 400 ha de soja. Ao mesmo tempo, um produtor vizinho, que respeitou a lei mantendo a floresta deverá manter os 320 ha e cultivar 80 ha. Neste exemplo, quem derrubou a mata será premiado.

• Ao retirar poderes do CONAMA enfraquece quem se opõe ao agronegócio. O CONAMA tem um perfil progressista e tem uma história reconhecida de defesa do meio ambiente, característica que os ruralistas, e quem agride o meio ambiente, deixaram bem claro, que não simpatizam.

• Os grandes proprietários e lavoureiros de soja, por exemplo, que não tem nas suas propriedades nenhum fragmento de Reserva Legal, agora de acordo com o Art. 38 § 6º inciso II “estar localizadas no mesmo bioma” , na prática, poderão compensar em lugares distantes, noutros estados inclusive, onde o valor da terra é bem inferior. Assim, se manterão lugares de monocultivos de soja ou cana, por exemplo, sem nada de vegetação do ecossistema original. Pelo texto aprovado, a Reserva Legal como função de conservar ecossistemas locais fica descaracterizada. No atual Código Florestal admitia a compensação, porém, determinava “que pertença ao mesmo ecossistema e seja localizada na mesma microbacia”. Fica evidente, mais uma vez, que os grandes produtores foram beneficiados.

• De acordo com o Art. 38 § 3º poderão recompor a Reserva Legal utilizando-se de 50% de espécies vegetais exóticas, e obtendo assim ganhos econômicos na recomposição pois está permitida a exploração econômica. Como aprovado no texto, a Reserva Legal descaracteriza-se como instituição de finalidade ecológica. Altera-se muito da concepção do atual Código Florestal, que admite a existência de exóticas, mas mediante plantio temporário, como espécies pioneiras, aquelas que ajudarão melhorar o solo “visando a restauração do ecossistema original”, e seguindo critérios técnicos do CONAMA. Além de obter lucro com as espécies exóticas, poderá ser também para os recursos naturais das espécies nativas, como consta no Art.18 § 1º “admite-se a exploração econômica da Reserva Legal mediante plano de manejo sustentável”. No Art. 21 inciso II novamente garante o uso econômico da modalidade de “manejo sustentável da Reserva Legal para exploração florestal com propósito comercial”. O uso econômico é para todas as propriedades.

• Em se cadastrando e se regularizando, poderão se beneficiar de políticas públicas e receber benefícios no crédito ou de algum outro tipo. Ao invés de responder pelas infrações poderão serem anistiados e beneficiados nas políticas públicas, como consta no Art. 49 e Art. 50.

• Aprovaram a emenda 164, que altera o Art. 8º, já referida anteriormente, consolidando as atividades agrícolas e crimes praticados até 22 de julho de 2008 e que regulamentará o manejo e a supressão de vegetação nativa das APPs, além disso, remete ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) que poderá ser realizado pelos Estados e Distrito Federal, deixando o CONAMA sem poder de interferir.

• No que se refere ao regime de “pousio” como área integrada a produção, portanto, consolidada, abre para dúvidas, pois não fixa prazo para que a terra fique parada para se recompor. Suspeita-se que é mais uma estratégia de converter matas em lavouras, valendo-se desse tipo de manejo.

• Os grandes produtores poderão concentrar ainda mais seus domínios de terras, pois o inciso IV do § 5º do Art. 38 autoriza a “aquisição” de terras para compensação. Desta forma, eles poderão comprar terras que não tem incidência de impostos e no futuro, talvez, ainda venderão créditos de carbono, portanto, os grandes nunca saem perdendo.

A Agricultura Familiar e o Código Florestal

No debate sobre o Código Florestal, a agricultura familiar foi estratégica para os ruralistas alcançarem seus objetivos. Certamente, sem os pequenos agricultores, o agronegócio não teria obtido o êxito que alcançou. O discurso somente se sustentou pelo uso constante e insistente que citava o caso dos parreirais e das macieiras que se localizam na serra, região de predominância de minifúndios, onde há muitas áreas tipificadas como sendo de preservação ambiental. Os grandes lavoureiros da soja do planalto se apoiaram nos micro e pequenos produtores de uva da serra. Os familiares foram parte da estratégia ideológica para dar vitória aos grandes. E, deu certo.

Em 2009, o então Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, esteve no Rio Grande do Sul, onde debateu, negociou e atendeu a um conjunto de pontos que os movimentos sociais reivindicavam. Muitas destas demandas logo em seguida, se concretizaram em decretos e resoluções. Entretanto, era necessário continuar a negociação entre Governo e agricultura familiar para avançar em pontos que ainda se faziam necessários, mas o diálogo foi interrompido. Recentemente, em abril de 2011 a Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, em Audiência Pública realizada no Rio Grande do Sul, representando o Governo Federal, se comprometeu em muitos pontos que atendiam a reivindicação dos movimentos sociais e, fundamentalmente, diferenciavam a agricultura familiar dos grandes produtores. Porém, mais uma vez o relator Aldo Rebelo resistiu e não diferenciou os pequenos dos grandes em questões estratégicas.

Dentre os avanços e retrocessos para a agricultura familiar, vejamos alguns aspectos para avaliação:

• Em relação ao relatório do Aldo Rebelo de 2010, foi incorporado o conceito da Lei nº 11.326/2006, uma reivindicação dos movimentos do campo. Entretanto, na prática, não há muitas vantagens exclusivas, pois Aldo Rebelo não concedeu exceções de impacto somente para a agricultura familiar, as concessões foram para todos, independente se tem 10 ou 10 mil hectares.

• Quanto à anistia de crimes ambientais, a política aprovada também vale para todos, portanto, inclui os agricultores familiares. Quem mais lucrou foram os grandes desmatadores, por terem mais área e localizadas em regiões onde ocorrem os maiores índices de derrubada de florestas. Tem alguns deputados da bancada ruralistas beneficiados com esta anistia.

• Para fins de regularização, o Art. 31 determina que o processo do Cadastro Ambiental Rural (CAR) será simplificado para a agricultura familiar. Sobre esse tratamento, vale lembrar, a “velha” Lei nº 4.771/65 que Instituiu o Código Florestal atual, no Art. 16, § 9º estabelece “A averbação da reserva legal da pequena propriedade ou posse rural familiar é gratuita, devendo o Poder Público prestar apoio técnico e jurídico, quando necessário”. Também o Decreto Federal nº 7.029/2009 Institui o Programa Federal de Apoio à Regularização Ambiental de Imóveis Rurais, o denominado Programa Mais Ambiente, que no Art. 2º, inciso IV define o agricultor familiar (conforme Lei 11.326/2006) como beneficiário especial com um conjunto de benefícios, quando comparado aos demais, com requisitos simplificados constando do Art. 5º § 1º “o georreferenciamento das informações apresentadas no croqui será elaborado pelo órgão ambiental, instituição pública ou privada devidamente habilitada, sem dispêndio financeiro por parte dos beneficiários especiais”. Este suposto benefício, portanto, já existe.

• Sobre as áreas com inclinação entre 25º e 45º, definidas como de uso restrito, há uma diferença em relação ao relatório de 2010. Antes restrita a atividades florestais, no aprovado, amplia para a manutenção de espécies lenhosas, perenes e de ciclo longo, silviculturais, inclusive, admitindo nas “áreas rurais consolidadas”, no Art.12 §1º a manutenção de “outras atividades agrossilvopastoris”, que traduzido, libera para qualquer atividade produtiva. Entretanto, fica mantida, a proibição de conversão para uso alternativo do solo de novas áreas.

• Poderão fazer o cômputo da APP na Reserva Legal, direito que o texto concede a todos as propriedades, independente do tamanho ou da condição socioeconômica do proprietário. Esse direito já está garantido no Art. 16 § 6º inciso II do atual Código Florestal, que admite o cômputo quando “exceder a 25% da pequena propriedade”, sendo posteriormente referendado e ampliado no acordo com o Ministério do Meio Ambiente, em 2009, para toda a agricultura familiar, mas necessitando introduzir na lei. Mais um benefício que também já existe.

• No Art. 10 estabelece que nas áreas que tratam os incisos VII, VIII e IX, do Art. 4º, que são serras e morros, localizadas em áreas rurais consolidadas será admitida a manutenção de espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo e pastoreio extensivo. De acordo com o texto, não se admite culturas anuais. Vale lembra que isso é para todos, independente de tamanho de área ou condição socioeconômica.

• No Art. 22 coloca que poderão fazer uso com manejo sustentável da Reserva Legal para fins de consumo próprio, sem propósito comercial, sem necessidade de comunicar ao órgão ambiental. Este direito já estava garantido anteriormente, mais uma vez nada de novo. Em suma falta muita informação, muitas supostas conquistas, já eram direito dos agricultores familiares.

• Ainda sobre a Reserva Legal, os agricultores familiares que tem nas suas propriedades vegetação nativa nos percentuais definidos deverão mantê-los e os que não tem, estão desobrigados de recuperar a Reserva Legal. Essa concessão é para propriedades de até quatro módulos fiscais, independente de ser agricultor familiar ou das chácaras de fim de semana. Não é um benefício exclusivo. Sobre isso a posição da Secretaria Agrária do PT, da bancada federal e do Governo Dilma sempre foi de que TODAS as propriedades deveriam ter a Reserva Legal. A posição do PT é baseada no princípio das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. Defendemos em nossos posicionamentos que a agricultura familiar deve ter compromisso com a preservação, proporcional ao seu tamanho e obtendo exceções, em razão da sua condição socioeconômica.

• Em relação a largura das faixas de preservação em beiras de rios, definidas como APPs, o relator manteve as mesmas metragens do atual Código para todas as cinco faixas especificadas, presentes no Art. 4º inciso I. Porém, na faixa de rios com até 10m de largura, diferenciou quem preservou de quem desmatou, favorecendo mais uma vez quem descumpriu a lei desmatando. Quer dizer, para os rios com menos de 10m de largura a situação aprovada é a seguinte, quem tem floresta mantém a metragem que consta atualmente de 30m, mas quem não tem vegetação nativa deverá recompor somente a metade, ou seja, recomposição de 15m. Essa exceção na recomposição é para todas as propriedades, não faz concessão somente a agricultura familiar.

• As áreas em torno das nascentes e dos olhos d'água, deverão manter vegetação nas margens de 50m.

• Sobre as APPs na beira de rios é mais uma situação em que Aldo Rebelo desconsiderou a agricultura familiar, porque não entendeu as suas peculiaridades, e que por isso deveriam constar no texto. A única exceção constante é válida para todos. A emenda 164 (Artigo 8º) abriu a possibilidade de que todas as atividades realizadas até julho de 2008 sejam mantidas, sendo assim, as ocupações e cultivos na beira de rios tem a chance de serem mantidas, porém, como isso é estendido a todas as propriedades e abre para os estados regulamentarem, a presidenta Dilma tende a vetar.

• O provável beneficio que os familiares teriam na carona dos grandes poderá cair com o veto, pois ao abrir para todos, acabará prejudicando os pequenos. A verdade é que Aldo Rebelo, mais uma vez traiu os pequenos. Se tivesse colocado no texto a exceção somente a agricultura familiar poderia ser mantida, porém ele não quis fazer isso. Se mantida assim e vetada pela presidenta Dilma, a agricultura familiar, ao ter que se adequar as metragens do Art. 14 será fortemente impactada, pois é justamente nas regiões de agricultura familiar que estão muitos rios e outras áreas de preservação. A Secretaria Agrária do PT do RS defendeu flexibilizar em até 50% das APPs, a partir de indicação do Zoneamento Ecológico-Econômico e com aprovação pelo CONAMA.

• O Art. 48 estabelece que o Poder Público instituirá apoio financeiro para as propriedades da agricultura familiar, incluindo a possibilidade de pagamento por serviços ambientais. Abre somente a “possibilidade”. Já o Art. 49, na sequência, estabelece que todo o proprietário inscrito no CAR, e regularizado, tem a possibilidade de obter benefícios de políticas públicas com incentivos financeiros no crédito agrícola. No fim das contas nada de concreto aos familiares e possibilidade de todos se beneficiarem de alguma forma. Em suma mais um engano.

• No Art.4º § 5º admite-se o plantio agrícola temporário e sazonal de vazante de ciclo curto, algo que é importante para os ribeirinhos. Isso já é permitido pelo CONAMA na Resolução nº 425/2010 “... desde que não impliquem supressão e conversão de áreas de vegetação nativa, no uso de agroquímicos e práticas culturais que prejudiquem a qualidade da água.”. O relator Aldo Rebelo, porém, retirou a restrição ao uso de agroquímicos, detalhe que faz toda a diferença, quando se trata de contaminação de águas e do cuidado necessário com a biodiversidade dos rios.


Considerações finais

O texto aprovado da Câmara dos Deputados pesou mais para a economia e para a produção agrícola, e menos para os ecossistemas. O propalado equilíbrio, que foi constantemente citado não aconteceu. Apesar da agricultura familiar ao ver o texto considerá-lo positivo em alguns aspectos, é importante ter o contexto, e no todo perceber que a grande vitória até aqui ainda é do agronegócio, tanto financeira quanto ideológica. A versão aprovada na Câmara Federal, para o Novo Código Florestal, reforça o modelo de desenvolvimento e tecnológico da Revolução Verde, predador dos recursos naturais, agroquímico, de monocultívos, latifundiário e concentrador de riquezas, que precisa constantemente de novas áreas para seguir se expandindo.

Estima-se que o país deixará de conservar milhões de hectares de vegetação nativa, em tempos que tanto se fala da importância do meio ambiente para as sociedades humanas. Apesar da retórica comum do Desenvolvimento Sustentável, que deveria integrar as dimensões, social, econômica, cultural e ambiental, o que ficou é que o econômico e imediato prevalece, mesmo que gere externalidades que, posteriormente, com certeza, outros pagarão.

Algumas questões que estão no texto e são favoráveis aos agricultores familiares já estavam garantidas anteriormente, ou havia o compromisso do PT e do Governo Dilma em atender as suas reivindicações, diferenciando pequenos agricultores de grandes. Infelizmente, o PT não conseguiu. Mas, o debate continua no Senado e no País.

Nesta nova etapa, será importante ampliar o debate, pois o que está em discussão não é somente sobre a área agricultável, mas também sobre ciclo da água, estabilidade do clima, e outros aspectos relacionadas ao meio ambiente e a vida no planeta.

Por fim, é preciso refletir sobre o que ocorreu, pois neste caso, do texto aprovado, afirmou-se que o crime compensa. Nesse processo quem cumpriu a lei perdeu. Em se tratando de construção de nação e de instituições, fica o sentimento de que o cumprimento da lei não vale a pena, e isso, no mínimo, deveria preocupar a todos que concordam e sonham com aquele slogan da campanha de Lula: “por um país decente”.

Nas palavras do Deputado Paulo Teixeira (PT-SP), líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados, Portal do PT, dia 27 de maio de 2011:

“Nessa primeira etapa da batalha pelo Código que queremos, não obtivemos sucesso. Quem perdeu não foi o governo, nem o PT. Perdeu o Brasil. Mas confiamos na força de mobilização da sociedade e nas negociações ainda no Senado e no retorno do texto à Câmara, para chegar a um texto mais equilibrado”.



Demilson Figueiró Fortes

Gilmar Zolet Vieira


Assessoria de Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente

Bancada do PT – Assembleia Legislativa do RS

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Carta de ex-ministros do Meio Ambiente

Preocupados com votação prevista para acontecer em breve na câmara federal, que poderá retroceder na proteção ambiental, grupo  de ex-ministros do Meio Ambiente divulgaram documento em defesa do debate democrático e responsável sobre o Código Florestal. 

Esta atitude é importante e merece o nosso respeito e reconhecimento. São válidos todos os esforços e iniciativas da sociedade civil brasileira que visem não deixar que Aldo Rebelo e seus amigos frente ruralistas e da CNA fragilizem a proteção ambiental no Brasil.




Carta Aberta à Presidente da República e ao Congresso Nacional



Os signatários desta Carta Aberta, ao exercerem as funções de Ministros de Estado ou de Secretário Especial do Meio Ambiente, tiveram a oportunidade e a responsabilidade de promover, no âmbito do Governo Federal, e em prol das futuras gerações, medidas orientadas para a proteção do patrimônio ambiental do Brasil, e com destaque para suas florestas. Embora com recursos humanos e financeiros limitados, foram obtidos resultados expressivos graças ao apoio decisivo proporcionado pela sociedade, de todos os presidentes da República que se sucederam na condução do país e do Congresso Nacional.

Mencione-se como exemplos: a Política Nacional do Meio Ambiente (1981), o artigo 225 da Constituição Federal de 1988, a Lei de Gestão de Recursos Hídricos (1997), a Lei de Crimes e Infrações contra o Meio Ambiente (1998), o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (2000), a Lei de Informações Ambientais (2003), a Lei de Gestão de Florestas Públicas (2006), a Lei da Mata Atlântica (2006), a Lei de Mudanças Climáticas (2009) e a Lei de Gestão de Resíduos Sólidos (2010).

Antes que o mundo despertasse para a importância das florestas, o Brasil foi pioneiro em estabelecer, por lei, a necessidade de sua conservação, mais adiante confirmada no texto da Constituição Federal e sucessivas regulamentações. Essas providências asseguraram a proteção e a prática do uso sustentável do capital natural brasileiro, a partir do Código Florestal de 1965. Marco fundante e inspiração nesse particular, o Código representa desde então a base institucional mais relevante para a proteção das florestas e demais formas de vegetação nativa brasileiras, da biodiversidade a elas associada, dos recursos hídricos que as protegem e dos serviços ambientais por elas prestados.

O processo de construção do aparato legal transcorreu com transparência e com a decisiva participação da sociedade, em todas as suas instâncias. E nesse sentido, é importante destacar que o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) já se constituía em excepcional fórum de decisão participativa, antecipando tendências que viriam a caracterizar a administração pública, no Brasil, e mais tarde em outros países. Graças a essa trajetória de responsabilidade ambiental, o Brasil adquiriu legitimidade para se tornar um dos participantes mais destacados nos foros internacionais sobre meio ambiente, além de hoje dispor de um patrimônio essencial para sua inserção competitiva no século XXI.

Para honrar e dar continuidade a essa trajetória de progresso, cabe agora aos líderes políticos desta Nação dar o próximo passo. A fim de que o Código Florestal possa cumprir sua função de proteger os recursos naturais, é urgente instituir uma nova geração de políticas públicas. A política agrícola pode se beneficiar dos serviços oferecidos pelas florestas e alcançar patamares de qualidade, produtividade e competitividade ainda mais avançados.

Tal processo, no entanto, deve ser desenvolvido com responsabilidade, transparência e efetiva participação de todos os setores da sociedade, a fim de consolidar as conquistas obtidas. Foram muitos os êxitos e os anos de trabalho de que se orgulham os brasileiros, e, portanto, tais progressos não devem estar expostos aos riscos de eventuais mudanças abruptas, sem a necessária avaliação prévia e o conveniente debate. Por outro lado, não consideramos recomendável ou oportuno retirar do Conama quaisquer de suas competências regulatórias no momento em que o país é regido pelo princípio da democracia participativa, consagrado na nossa Carta Magna.

Não vemos, portanto, na proposta de mudanças do Código Florestal aprovada pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados em junho de 2010, nem nas versões posteriormente circuladas, coerência com nosso processo histórico, marcado por avanços na busca da consolidação do desenvolvimento sustentável.

Ao contrário, se aprovada qualquer uma dessas versões, agiremos na contramão de nossa história e em detrimento de nosso capital natural.

Não podemos, tampouco, ignorar o chamado que a comunidade científica brasileira dirigiu recentemente à Nação, assim como as sucessivas manifestações de empresários, representantes da agricultura familiar, da juventude e de tantos outros segmentos da sociedade. Foram suficientes as expectativas de enfraquecimento do Código Florestal para reavivar tendências preocupantes de retomada do desmatamento na Amazônia, conforme demonstram de forma inequívoca os dados recentemente divulgados pelo Inpe.

Entendemos, Senhora Presidente e Senhores congressistas, que a história reservou ao nosso tempo e, sobretudo, àqueles que ocupam os mais importantes postos de liderança em nosso país, não só a preservação desse precioso legado de proteção ambiental, mas, sobretudo, a oportunidade de liderar um grande esforço coletivo para que o Brasil prossiga em seu caminho de Nação que se desenvolve com justiça social e sustentabilidade ambiental.

O esforço global para enfrentar a crise climática precisa do ativo engajamento do Brasil. A decisão de assumir metas de redução da emissão dos gases de efeito estufa, anunciadas em Copenhagen, foi um desafio ousado e paradigmático que o Brasil aceitou. No próximo ano, sediaremos a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, e o Brasil poderá continuar liderando pelo exemplo e inspirando os demais países a avançar com a urgência e a responsabilidade que a realidade nos impõe.

É por compreender a importância do papel na luta por um mundo melhor para todos e por carregar esta responsabilidade histórica que nos sentimos hoje na obrigação de dirigirmos a Vossa Excelência e ao Congresso Nacional nosso pedido de providências. Em conjunto com uma Política Nacional de Florestas, o Código deve ser atualizado para facilitar e viabilizar os necessários esforços de restauração e de uso das florestas, além que de sua conservação. É necessário apoiar a restauração, não dispensá-la. O Código pode e deve criar um arcabouço para os incentivos necessários para tanto.

O próprio Conama poderia providenciar a oportunidade para que tais assuntos sejam incorporados com a devida participação dos Estados, da sociedade civil e do mundo empresarial. Do nosso lado, nós colocamos à disposição para contribuir para este processo e confiamos que sejam evitados quaisquer retrocessos nesta longa e desafiadora jornada.



Brasília, 23 de maio de 2011

Carlos Minc (2008-2010)

Marina Silva (2003-2008)

José Carlos Carvalho (2002-2003)

José Sarney Filho (1999-2002)

Gustavo Krause (1995-1999)

Henrique Brandão Cavalcanti (1994-1995)

Rubens Ricupero (1993-1994)

Fernando Coutinho Jorge (1992-1993)

José Goldemberg (1992)

Paulo Nogueira Neto (1973-1985)