Folha de
São Paulo, 07/06/2013
Energia
= precariedade ambiental?
Por Moisés Naím
Em minha
coluna anterior ("A Revolução Mais Importante"), descrevi
as transformações profundas no mundo da energia. A explosão do
consumo energético na Ásia, liderada pela China; a irrupção das
Américas como possível fonte principal de petróleo e gás para o
mundo; a nova hiperconcorrência entre países e empresas e a
iminente autossuficiência energética dos EUA são algumas das
mudanças que nos alertam para o surgimento de uma nova ordem
energética mundial.
Talvez o
mais inesperado tenha sido que as discussões entre especialistas
passaram da ênfase sobre a escassez de energia para a abundância.
Um estudo do Citigroup conclui que o consumo de energia chegará ao
nível mais alto em 2020, passando a declinar a partir daí.
Tudo
isso, que pode passar uma impressão muito boa para os consumidores
de energia, é também devastador para o planeta. Como nós,
consumidores, somos habitantes do planeta, também é devastador para
nós e nossos descendentes.
Nesta
nova ordem energética reinam o carvão, o gás e o petróleo,
enquanto a energia solar, nuclear, eólica e as outras que provêm de
fontes renováveis e não são tão prejudiciais ao ambiente ficam em
desvantagem.
Isso
significa que as emissões de gás carbônico que contribuem para o
aquecimento global causado pela atividade humana não só não vão
diminuir, como seria desejável, como, pelo contrário, vão
aumentar.
(Se você
não acredita que as mudanças climáticas sejam causadas pelas
emissões de CO2 produzidas pelos humanos, leia os 11.944 artigos
científicos publicados entre 1991 e 2011 por 29.083 autores; 98,4%
concluem que o aquecimento global é produzido por nós.)
Parece
inevitável que continuemos a emitir CO2 a uma velocidade que levará
a temperatura média do planeta a subir ao menos 2ºC. Esse aumento
mudará o mundo tal como o conhecemos. E não para melhor. A que se
deve tanta complacência?
Existem
várias razões. Ignorância. Desconfiança em relação aos
"especialistas" e ceticismo quanto à validade das
pesquisas.
Prazos
aparentemente muito distantes para que os efeitos se façam sentir em
toda sua magnitude e que, com isso, criam a ilusão de que o
aquecimento global não é uma emergência.
Crise
econômica e outras urgências que não deixam espaço, dinheiro ou
capital político para problemas que não sejam imediatos.
Insuficiente
solidariedade intergeracional (os adultos não temos mostrado muita
disposição em fazer sacrifícios para legar aos jovens um mundo
mais habitável). Sensação de impotência e resignação diante da
informação de que as tendências são irrefreáveis.
O que
fazer, então? Não existem soluções mágicas, mas sim uma série
de esforços que podem, se não reverter, ao menos desacelerar a
marcha rumo ao desastre.
Encarecer
o consumo de energia que emite CO2 e investir maciçamente em novas
tecnologias são dois objetivos óbvios. Mas o problema não é o que
fazer, e sim ter a disposição de fazê-lo. É isso o que falta.
Tradução
de CLARA ALLAIN
O escritor venezuelano Moisés Naím, do Carnegie Endowment for
International Peace, foi editor-chefe da revista "Foreign
Policy". Escreve às sextas na versão impressa de "Mundo".
Artigo publicado na Folha de São Paulo, dia 7 de junho de 2013.