Quem é
populista?
Tarso Genro
Tenho
procurado me preservar de debater, neste momento, por razões
diferentes, tanto o Governo Sartori, como o segundo Governo Dilma.
Assim como os governantes, que iniciam os seus governos, entendo que
-a menos que surja alguma questão de princípio- os governantes que
saem, também devem ter um certo "período de graça".
Ontem, porém, sem ofender ninguém, ou fazer críticas a alguém,
não me contive e tuitei que estava feliz com a decisão do Tribunal
de Justiça, sobre a constitucionalidade do novo Mínimo Regional, de
R$ 1006,88. É um valor que não é elevado, mas que melhora a
alimentação de mais de 1,5 milhões de famílias trabalhadoras
gaúchas: crianças, jovens, idosos, que poderão comer um pouco
melhor.
Hoje me
deparo com um odioso editorial do jornal Zero Hora, que me acusa de
tentar "então na chefia de governo, antes de abandonar o poder,
submeter ao parlamento uma proposta nitidamente populista".
Quero sustentar, neste pequeno texto, que "populista" é o
editorial de ZH, além de falso e preconceituoso.
Vejamos.
Falso, porque omite -como reconhece na noticia que divulga, na mesma
edição na página 11- que no final do meu governo, apenas recuperei
a mesma posição do SM Regional de 2001, que veio, paulatinamente,
sendo achatado pelos governos que sucederam Olívio Dutra. Tal
recuperação eu propusera de forma transparente, no meu Programa de
Governo e defendido esta posição, inclusive perante a própria
Federasul, nos debates que precederam a minha eleição. Falso,
também, porque ao contrário do que diz o editorial, não "tentei"
submeter o parlamento. Eu "remeti" ao parlamento um
projeto, de acordo com as minhas prerrogativas constitucionais, que
foi apreciado de forma regular por aquela instituição.
.
Preconceituoso.
O editorial é preconceituoso contra os pobres porque qualifica a
minha proposta como "populista". Com esta definição, o
honorável periódico desconhece a elementar definição, na Teoria
Política, do verdadeiro significado deste tipo de ação partidária
ou estatal, que, de um lado, busca prescindir das instituições
regulares do Estado para promover os seus atos e, de outro, procura
instrumentalizar as instituições para conter os ímpetos de
transformação radical, que possa vir dos pobres e explorados. O
populismo considera o povo uma "massa informe", manipulável
pelo poder: o povo considerado como "agregado social homogêneo",
sempre depositário de valores positivos e permanentes, acima e afora
das classes sociais. O povo como objeto manipulável, não as classes
como sujeitos.
Onde está
o populismo num episódio em que o Governo simplesmente encaminha,
regularmente, com apoio do parlamento e por dentro das instituições
regulares do Estado (agora com chancela do Poder Judiciário), um
aumento constitucional de renda para os mais pobres? Foi, também,
uma atitude "populista, a atitude da Assembleia que votou e do
Tribunal de Justiça, que considerou o projeto constitucional? O
abuso da expressão "populista", pelos ultraliberais e
neoliberais, parte do pressuposto que os assalariados e os pobres são
sempre os contingentes do sacrifício, em qualquer situação de
crise, e que os ricos e os muito ricos devem vigiar qualquer política
que melhore a renda dos pobres, porque isso é "populismo".
Sempre
defendemos os aumentos de salários, tanto do setor público como do
setor privado, como elementos de política econômica e de estímulo
ao desenvolvimento do estado e do país, combinados com medidas de
estímulo ao emprego e à atração de investimentos, de fora do
Estado e de fora do país, com programas transparentes e acessíveis
a todo o setor produtivo. Como toda a posição sobre temas graves e
relevantes, dentro de uma crise, a nossa pode ser alvo de objeções,
como nós objetamos, por exemplo, que as políticas de austeridade
possam tirar qualquer país da estagnação.
Taxar,
porém, de "populista" uma definição do salário mínimo
regional feita por um Governo sério, que que abriu um diálogo
inédito no Estado através do CDES, com a participação de todos os
setores da sociedade é, na verdade, trocar o debate pela ofensa a
quem tem princípios. Estamos autorizados a pensar, a partir desta
ofensa senil, que está se inaugurando, aí sim, um novo tipo de
"populismo midiático", com fins lucrativos: cortejar os
empresários, que estavam defendendo, no Foro apropriado, o que
julgavam seus direitos, para certamente estes aumentarem os seus
gastos em publicidade. Aonde? Adivinhem. "Parem de mimar os
ricos", disse o milionário Warren Buffet, quando, na era Busch,
era reformado o sistema fiscal para proteger os mais ricos e ferrar
os mais pobres. Aqui, isso seria pedir demais à Zero Hora. Mas, pelo
menos, podemos pedir, "parem de ferrar os pobres", os que
vivem de Salário Mínimo, para que gente possa distribuir ainda mais
renda e sair da crise sem sacrificar os que podem menos!
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