Estudo
mostra que agrotóxicos podem causar distúrbios reprodutivos
Efeitos
dos produtos químicos podem se estender também a problemas
neurológicos, respiratórios e hepáticos
Um estudo
elaborado pelo aluno de doutorado em Saúde Pública e Meio Ambiente
da Ensp/Fiocruz Cleber Cremonese observou que grande parte dos
agrotóxicos apresenta capacidade de desregulação do sistema
endócrino humano, o que altera os níveis de hormônios sexuais e
causa efeitos adversos, principalmente sobre o sistema reprodutor.
Câncer
de mama e ovário, desregulação de ciclo menstrual, câncer de
testículo e próstata, infertilidade, declínio da qualidade seminal
e malformação de órgãos reprodutivos são alguns dos exemplos
dessas complicações.
Segundo
Cleber, com o aumento do consumo nacional de agrotóxicos, tanto no
agronegócio como na agricultura familiar, crescem as evidências de
que a utilização destas substâncias não está apenas relacionada
especificamente à produção agrícola, mas se transforma em um
problema de saúde pública.
Para
avaliar a exposição aos agrotóxicos e os possíveis impactos desta
exposição nos níveis de hormônios sexuais de homens e mulheres,
além da qualidade do sêmen de adultos e jovens, o doutorando pautou
sua pesquisa na observação de moradores da área rural do município
de Farroupilha (RS).
Foram
feitos dois estudos transversais, com objetivos específicos,
populações e metodologias de coleta particulares. A tese
investigou, no primeiro estudo, adultos de ambos os sexos,
trabalhadores rurais e seus familiares, com idades compreendidas
entre 18 e 69 anos. No segundo estudo, participaram da investigação
jovens moradores rurais e urbanos, com idade entre 18 e 23 anos.
Na
pesquisa, conforme explicou o aluno, foram coletadas amostras de
sangue e sêmen para mensurar níveis de atividade de colinesterases,
níveis hormonais sexuais e outros parâmetros bioquímicos, além de
parâmetros espermáticos.
Também
foram aplicados questionários para identificar possíveis fatores
associados aos desfechos reprodutivos, além de análises descritivas
e bivariadas e regressões multivariadas, realizadas para identificar
possíveis associações.
No
primeiro estudo, os homens que tinham mais contatos com agrotóxicos
apresentaram aumento de 14% na concentração de testosterona e
redução de hormônio luteinizante (LH) de 20%; a globulina
transportadora de hormônio sexual (SHBG) apresentou associação
positiva e significativa com os níveis de butirilcolinesterase
(BChE).
Em
relação aos que trabalhavam há mais de 25 anos na agricultura,
observou-se uma redução de 20% nos níveis desse hormônio. Nas
mulheres que trabalharam nos últimos três meses foi constatado
menores níveis de prolactina. Na regressão logística, homens
usando inseticidas e pesticidas organofosforados, respectivamente,
tiveram menor chance de ter a prolactina reduzida.
Da mesma
forma, foi observada nas mulheres associação inversa entre contato
com agrotóxicos autorreferido alto e a chance de apresentar a
prolactina reduzida.
No
segundo estudo, as alterações nos níveis de hormônios sexuais
estiveram associadas às características de gestação e nascimento,
com maiores níveis de exposição a agrotóxicos e com local de
moradia.
Quanto
aos parâmetros espermáticos, a motilidade foi significativamente
menor nos jovens rurais do que nos urbanos, naqueles que relataram
contato com agrotóxicos alto e nos que usavam fungicidas no momento
da coleta. A morfologia mostrou-se reduzida entre 15% e 32% nos
moradores rurais e com mais contatos com agrotóxicos.
Também
foram observadas diferenças significativas nas medidas anatômicas
sexuais (volume testicular e distância anogenital) quanto ao local
de moradia, exposição a agrotóxicos e características de
gestação.
A partir
dessas observações, Cleber concluiu que os achados são sugestivos
de que exposições crônicas a agrotóxicos interferem na regulação
dos hormônios sexuais em adultos, bem como na qualidade seminal dos
jovens da área de estudo.
Efeitos
dos agrotóxicos se estendem a problemas neurológicos, respiratórios
e hepáticos
No
Brasil, a utilização dos agrotóxicos é extremamente relevante no
modelo de desenvolvimento do setor agrícola. Em consequência disso,
o país é hoje o maior consumidor mundial das substâncias.
Segundo o
aluno, o uso destes agentes também têm sido associado ao
desenvolvimento de doenças neurodegenerativas, como parkinson,
distúrbios cognitivos, transtornos psiquiátricos, alterações
respiratórias e imunológicas e problemas hepáticos e renais.
“Estudos
apontam ainda associação entre exposição intrauterina aos
agrotóxicos e efeitos teratogênicos, tais como malformações
congênitas, aborto e baixo peso ao nascer.”, citou.
Para
Cleber, a exposição crônica aos agrotóxicos, adicionalmente com a
falta de proteção pessoal durante manuseio, além da carência e
conhecimento no que diz respeito aos riscos do contato e a escassez
de programas públicos com objetivo de diminuir o uso intenso e que
tragam alternativas no cultivo de alimentos estão entre os
principais problemas associados ao crescente uso dessas substâncias.
Visando
solucionar essas questões implicadas pelo uso de agrotóxicos, o
aluno sugere a realização de novos estudos para melhor avaliar a
exposição da população investigada e outras populações rurais
brasileiras, utilizando delineamento longitudinal, que possam melhor
medir e compreender a complexidade da exposição crônica aos
agrotóxicos.
"É
importante que sejam realizadas intervenções a curto, médio e
longo prazo para reduzir ou minimizar os prejuízos à saúde das
populações sob risco", pontuou.
Fonte:
Fundação Oswaldo Cruz
Portal
Brasil
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