Três reportagens sobre mudanças climáticas
Emissões
mundiais da agropecuária dobram em 50 anos
Pela
primeira vez, FAO analisou as emissões globais decorrentes da
agricultura, pecuária, silvicultura e pesca. No Brasil, agropecuária
é o setor que mais emite gases do efeito estufa.
As
emissões de gases do efeito estufa provenientes da agropecuária,
silvicultura e pesca praticamente dobraram nos últimos 50 anos. Até
2050, esse volume deve crescer 30% caso a expansão do setor continue
no ritmo atual e nada aconteça para frear as emissões. O alerta é
da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura
(FAO) em um relatório divulgado nesta sexta-feira (11/04).
Esta é a
primeira vez que as emissões da agricultura são calculadas em nível
global. "Os novos dados da FAO são a fonte de informação mais
completa já feita sobre a contribuição da agricultura para o
aquecimento global. Até agora, cientistas e autoridades tinham
dificuldades para formular decisões estratégicas como resposta para
as mudanças climáticas devido à falta de informação. Essa lacuna
também impedia os esforços para mitigar as emissões da
agricultura", afirma Francesco Tubiello, da FAO.
O
documento aponta que, em 2001, a agropecuária emitiu aproximadamente
4,7 bilhões de toneladas de dióxido de carbono equivalentes (CO2e).
Em dez anos, as emissões aumentaram 14%, atingindo um volume de 5,3
bilhões de toneladas de CO2e em 2011. O maior crescimento ocorreu
nos países em desenvolvimento, que expandiram esse setor.
Em
contrapartida, as emissões do uso do solo e desmatamento reduziram
cerca de 10% no mesmo período. A média foi de três bilhões de
CO2e. A queda do desmatamento foi a principal responsável por essa
redução. No Brasil, dono da maior reserva de floresta tropical, o
corte de árvores caiu 77,8% entre 2004 e 2011, segundo dados do
Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia).
Uso em
geral
O
relatório aponta a pecuária como maior vilã do setor: a atividade
foi responsável por 39% de todas as emissões em 2011. Os gases,
principalmente o metano, são fruto da fermentação entérica, ou
seja, do processo digestivo de bois, ovinos e caprinos. A expansão
dessa atividade contribuiu para o aumento de 11% da produção de
metano pelo gado entre 2001 e 2011. Índia e Brasil são donas dos
maiores rebanhos bovinos do mundo.
Nesse
mesmo período, as emissões provenientes da aplicação de
fertilizantes sintéticos aumentaram 37%. Em 2011, elas representam
14% da emissão total. A grande maioria dos gases do efeito estufa
provenientes da agricultura, ou seja 45%, vieram da Ásia, seguida
pela América com 25%, da África com 15%, da Europa com 11% e da
Oceania com 4%.
O
relatório também mediu as emissões resultantes do uso de energia
no setor agrícola como, por exemplo, a eletricidade e combustíveis
fósseis queimados nessas atividades. Em 2010, essa taxa foi de 785
milhões de toneladas de CO2e, representando um aumento de 75% em
relação a 1990.
Emissões
brasileiras
No
Brasil, segundo os dados oficiais mais recentes, a agropecuária é a
líder de emissões no país, responsável por 35% de todas as
emissões de CO2e desde 2010. O volume total emitido pelo setor
naquele ano foi de 437,2 milhões de toneladas. Em relação a 2005,
houve um crescimento de 5,2%.
Essa
elevação ocorreu devido à expansão do rebanho bovino e ao aumento
do uso de fertilizantes nitrogenados. Para reduzir as emissões neste
setor, o governo brasileiro lançou em 2010 o programa Agricultura de
Baixa Emissão de Carbono (ABC). O país pretende reduzir entre 36,1%
e 38,9% as emissões de gases do efeito estufa até 2020 com base nos
números de 1990.
Uma das
principais metas do plano é a recuperação de 15 milhões de
hectares de pastagens degradadas. Se cumpridos, os objetivos podem
contribuir para uma redução de 133,9 milhões de toneladas até
162,9 milhões de CO2e.
ONU
diz que mudanças climáticas elevam risco de conflitos no mundo
Documento
divulgado no Japão afirma que as crescentes emissões de gases do
efeito estufa ampliam o risco de conflitos, fome, enchentes e
migrações em massa e diz que efeitos das mudanças climáticas já
podem ser sentidos.
A segunda
parte do quinto relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças
Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), da ONU, alerta governos de
todo o mundo sobre os perigos práticos que as mudanças climáticas
podem ter sobre as vidas das pessoas.
O
documento, aprovado por unanimidade por mais de cem países e
divulgado nesta segunda-feira (31/03) em Yokohama, no Japão, afirma
que as crescentes emissões de gases do efeito estufa ampliam o risco
de conflitos, fome, enchentes e migrações em massa.
"O
aumento da magnitude do aquecimento eleva a probabilidade de impactos
graves, penetrantes e irreversíveis", diz o relatório. O texto
utilizou como base mais de 12 mil estudos científicos e foi
classificado como um dos "mais completos da história" pelo
secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial, Michel
Jarraud.
O informe
ainda alerta que o impacto dessas mudanças não será sentido
igualmente em todo o mundo, resultando num aumento da desigualdade
entre ricos e pobres, saudáveis e doentes, jovens e velhos, e homens
e mulheres.
Segundo o
documento, alguns lugares terão água demais, enquanto outros terão
pouco acesso à água potável. Outros riscos mencionados são
referentes ao preço e à disponibilidade de alimentos, às doenças
e até mesmo à paz mundial.
Apelo
para a ação
O
relatório é explícito ao afirmar que os efeitos das mudanças
climáticas já podem ser sentidos pelas pessoas e percebidos no meio
ambiente. Esses efeitos serão ainda maiores se nada for feito para
evitar o aquecimento global.
"Antes
apenas podíamos supor que algumas alterações tivessem uma relação
com as mudanças climáticas, mas agora há acontecimentos sobre os
quais podemos afirmar que foram causados pelo clima. Por exemplo, a
seca na Austrália", afirma Jarraud. "Já que não há
nenhuma dúvida de que o clima está mudando", apontou,
sublinhando que "95% dessas mudanças se devem à ação
humana".
O
documento diz que desastres do século 21 como as ondas de calor na
Europa, os incêndios florestais nos Estados Unidos, as secas na
Austrália e as enchentes na Ásia apenas destacam o quão vulnerável
a humanidade é a extremas condições climáticas. "É um apelo
para agirmos", afirma o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri.
Segundo ele, se os governos mundo afora não reduzirem suas emissões
de carbono, o impacto do aquecimento global pode ficar "fora de
controle".
Alerta
global
Parte do
informe desta segunda-feira, porém, discute o que pode ser feito
para tentar amenizar os efeitos do problema. Entre as soluções
propostas estão a redução da poluição, a adaptação às
mudanças climáticas e o planejamento sustentável.
O
documento ainda recomenda a redução do desperdício de água, a
construção de parques arborizados para aliviar o calor em grandes
cidades, e a prevenção do assentamento de pessoas em lugares
expostos a condições climáticas extremas.
O
relatório é o primeiro do IPCC a ser divulgado desde 2007, quando
um forte documento foi publicado, causando uma onda de ações
políticas que indicavam um possível acordo global sobre o tema em
Copenhagen em 2009.
No
entanto, nações presentes na conferência da Dinamarca falharam em
chegar a um consenso sobre o tema. A expectativa agora se volta para
a Conferência do Clima de 2015, quando um novo tratado internacional
nos moldes do Protocolo de Kyoto, criado em 1997 e extinto em 2012,
deve ser assinado.
RM/AS/dw/afp/ap/dpa/lusa
Influência
humana é clara no aquecimento "inequívoco" do planeta,
diz IPCC
Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas divulga primeira parte de
estudo sobre aumento da temperatura no globo e afirma que últimas
três décadas foram sucessivamente mais quentes que qualquer outra
desde 1850.
O
aquecimento do planeta é "inequívoco", a influência
humana no aumento da temperatura global é "clara", e
limitar os efeitos das mudanças climáticas vai requerer reduções
"substanciais e sustentadas" das emissões de gases de
efeito estufa. A conclusão é do Painel Intergovernamental de
Mudanças Climáticas (IPCC), que divulgou nesta quinta-feira
(30/01), em Genebra, a primeira parte do quinto relatório sobre o
tema.
Os
cientistas do IPCC – que já foram premiados com o Nobel da Paz em
2007 – fizeram um apelo enfático para a redução de gases
poluentes. "A continuidade das emissões vai continuar causando
mudanças e aquecimento em todos os componentes do sistema
climático", afirmou Thomas Stocker, coordenador e principal
autor da Parte 1 do quinto Relatório sobre Mudanças Climáticas,
cuja versão preliminar já foi apresentada em setembro de 2013.
O
documento serviu de base durante a Conferência das Partes (COP) das
Nações Unidas sobre o Clima em Varsóvia, na Polônia, no final do
ano passado. Em 1500 páginas, cientistas de todo o mundo se
debruçaram sobre as bases físicas das mudanças climáticas,
apoiados em mais de 9 mil publicações científicas.
"O
relatório apresenta informações sobre o que muda no clima, os
motivos para as mudanças e como ele vai mudar no futuro", disse
Stocker.
Correções
A versão
final divulgada nesta quinta é um texto revisado e editado e não
tem muitas mudanças em relação ao documento apresentado em
setembro do ano passado, que elevou o alerta pelo aquecimento global
e destacou a influência da no processo.
"A
influência humana no clima é clara", afirma o texto. "Ela
foi detectada no aquecimento da atmosfera e dos oceanos, nas mudanças
nos ciclos globais de precipitação, e nas mudanças de alguns
extremos no clima."
Segundo o
IPCC, desde a década de 1950, muitas das mudanças observadas no
clima não tiveram precedentes nas décadas de milênios anteriores.
"A atmosfera e os oceanos estão mais quentes, o volume de neve
e de gelo diminuíram, os níveis dos oceanos subiram e a
concentração de gases poluentes aumentou", diz um resumo do
documento.
"Cada
uma das últimas três décadas foi sucessivamente mais quente na
superfície terrestre que qualquer década desde 1850. No hemisfério
norte, o período entre 1983 e 2012 provavelmente foi o intervalo de
30 anos mais quente dos últimos 800 anos", prossegue.
Aquecimento
dos oceanos
O grupo
de cientistas também lembra que o aquecimento dos oceanos domina o
aumento de energia acumulada no sistema climático, e que os mares
são responsáveis por mais de 90% da energia acumulada entre 1971 e
2010.
"É
praticamente certo que o oceano superior (até 700m de profundidade)
aqueceu neste período, enquanto é apenas provável que tenha
acontecido o mesmo entre 1870 e 1970", diz o relatório.
O nível
dos mares também aumentou mais desde meados do século 20 que
durante os dois milênios anteriores, segundo estima o IPCC. Entre
1901 e 2010, o nível médio dos oceanos teria aumentado cerca de 20
centímetros, diz o documento.
As
concentrações atmosféricas de dióxido de carbono, metano e
protóxido de nitrogênio (conhecido como gás hilariante)
aumentaram, principalmente por causa da ação humana. Tais aumentos
se devem especialmente às emissões oriundas de combustíveis
fósseis. Os oceanos, por exemplo, sofrem acidificação por absorver
uma parte do CO2 emitido.
Futuro
sombrio
A
temperatura global deverá ultrapassar 1,5ºC até o final deste
século em comparação com níveis estimados entre 1850 e 1900. O
aquecimento global também deverá continuar além de 2100, mas não
será uniforme, dizem os cientistas do clima. As mudanças nos ciclos
da água no mundo também não serão homogêneos neste século, e o
contraste entre regiões secas e úmidas e regiões de seca e de
chuvas deverá aumentar.
O resumo
do texto ainda constata que a acumulação de emissões de CO2 deverá
ser determinante para o aquecimento global no final do século 21 e
adiante. "A maioria dos efeitos das mudanças climáticas
deverão perdurar por vários séculos, mesmo com o fim das
emissões."
Até
outubro, o IPCC ainda vai publicar mais duas partes do relatório e
também um documento final. A segunda parte será divulgada em março,
no Japão, e detalhará os impactos, a adaptação e a
vulnerabilidade a mudanças climáticas. Em abril, Berlim será palco
das conclusões do IPCC sobre mitigação.
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