Desenvolvimento
sustentável é sem agrotóxicos
Adão Villaverde
Durante
audiência pública promovida pela Comissão de Agricultura, nesta
semana, a Assembleia Legislativa gaúcha voltou ao tema polêmico e
recorrente da alteração da “Lei dos Agrotóxicos” que vige
desde 1982 no Rio Grande, estabelecendo uma legislação inovadora
que serviu de referência para outros estados.
Ao longo
do encontro recordei de um livro, cuja leitura recomendo, do
economista Paul Gilding, “A Grande Ruptura”, que prega a
reconsideração de nossos valores de progresso. Em ambos os casos o
pano de fundo é um só: o conceito de desenvolvimento que queremos
para o presente e para as futuras gerações.
Quanto à
lei que completará 30 anos no dia 22 de dezembro, mais uma vez
defendem sua “flexibilização”, principalmente no que diz
respeito ao artigo que exige a comprovação de autorização de uso
do produto em seu país de origem. Querem que um produto cuja
utilização é proibida na nação onde foi fabricado tenha seu uso
liberado em solo gaúcho. Exemplo: um produto de alta toxidade e
contaminação do meio ambiente já foi banido nos EUA, mas continua
com seu uso liberado no resto do Brasil. O fabricante norte-americano
exporta praticamente toda produção para nosso país, que ostenta a
duvidosa posição de campeão mundial de consumo de agrotóxicos. E
somente por conta da atual legislação é que o RS está protegido
dos riscos do seu uso proibido em território riograndense.
A lei
contempla cuidados com a saúde, com a produção de alimentos com
qualidade e a defesa do meio ambiente, além de servir de elemento
importante para a construção de uma visão de sustentabilidade que
projetou o RS. É por causa da sua enorme importância, que propomos
uma homenagem aos 30 anos de vigência da Lei nº 7.747 de 22/12/1982
e, a partir do ano que vem, uma Campanha de Divulgação e Promoção
da Lei ao ingressar em sua quarta década em vigor.
Recentemente,
me deparei, pelas redes sociais, com uma entrevista do economista
André Lara Resende, um dos “pais do Plano Real”, que disparou a
mesma tese de Gilding: ”temos que rever o que consideramos
progresso”.Coincidência ou não, mas vindo de um dos formuladores
da teoria de que, diante da evolução da crise econômica mundial, a
saída era sustentar que somente a adoção de planos de austeridade
seria capaz de acalmar os mercados, não deixa de ser uma enorme
autocrítica, mas sobretudo uma grande e talvez fundamental novidade.
É claro
que não devemos ser ingênuos. Rezende também escreve isso para
demarcar com a visão desenvolvimentista, que defende que os governos
façam fortes investimentos e dirijam os chamados “gastos públicos”
para estimular o crescimento e o desenvolvimento, em curso hoje no
Brasil. Que, aliás, foi fundamental para que pudéssemos atravessar
ao menos em melhores condições que outros países, a crise mundial.
O que fez
o criador do Real foi se ancorar na tese de Gilding, que propugna “a
ruptura com a economia que conhecemos, do consumismo desenfreado, de
um estilo de vida e de um modelo de desenvolvimento econômico que
não medem o impacto nos recursos finitos do planeta”, qual seja,
crescer a qualquer custo, mesmo que sem sustentabilidade.
O que
talvez deve se ressaltar, aqui, é que ainda há margens
significativas para aplicabilidade do modelo desenvolvimentista em
países como o Brasil e outros, mas que, de fato, não existe mais
nos chamados países centrais. Mesmo que exemplos sejam
reducionistas, o Japão é um deles: não cresce há mais de 15 anos.
Portanto,
a decorrência fundamental que devemos tirar da tese de Gilding,
chancelada por Resende, é que mesmo com margem ainda para crescer,
apostando somente nesta lógica, poderemos estar indo para o mesmo
caminho dos países centrais e vamos esbarrar, sim, nos limites
físicos do planeta. E como diz o economista, “a recusa de ver e
agir em relação aos limites ecológicos, vai nos levar a um
desordenamento e para um processo bem mais oneroso” do que se
tivéssemos sidos capazes de nos preparar para abordar o
desenvolvimento a partir de um novo ângulo e com sustentabilidade.
Portanto,
o modelo sustentável é aquele em que o bem-estar passa pela
inclusão, coesão social, renda, qualidade de vida, menor
desigualdade, cuidado com as pessoas, com as cidades com os
alimentos, com água, com energia renovável e a defesa do planeta. E
não pela mera lógica desenfreada de consumo, com um fim nela mesmo.
É tempo
de recuperar e atualizar a noção da nossa geração e das que nos
seguirão acerca de por onde devemos caminhar. Precisamos redescobrir
uma verdadeira consciência para um padrão de desenvolvimento de
novo tipo, do contrário os limites físicos do planeta se excederão.
Ser
contra a flexibilização da lei dos agrotóxicos é ser a favor do
meio ambiente, da qualidade dos nossos alimentos, solos e água. Ser
contra a alteração dessa lei é ser a favor de um novo modelo de
desenvolvimento. É ser, portanto, a favor da própria vida.
E a
recusa de ver e agir e mesmo a coragem de romper com o modelo de
desenvolvimento produzido e reproduzido pela modernidade, poderá
estar nos conduzindo, todos juntos, para a ante-sala do colapso do
planeta e, portanto, para o mesmo naufrágio.
Adão
Villaverde é engenheiro, professor, deputado, ex-presidente AL/RS
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