quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Desenvolvimento sustentável é sem agrotóxicos



Desenvolvimento sustentável é sem agrotóxicos

Adão Villaverde

Durante audiência pública promovida pela Comissão de Agricultura, nesta semana, a Assembleia Legislativa gaúcha voltou ao tema polêmico e recorrente da alteração da “Lei dos Agrotóxicos” que vige desde 1982 no Rio Grande, estabelecendo uma legislação inovadora que serviu de referência para outros estados.

Ao longo do encontro recordei de um livro, cuja leitura recomendo, do economista Paul Gilding, “A Grande Ruptura”, que prega a reconsideração de nossos valores de progresso. Em ambos os casos o pano de fundo é um só: o conceito de desenvolvimento que queremos para o presente e para as futuras gerações.

Quanto à lei que completará 30 anos no dia 22 de dezembro, mais uma vez defendem sua “flexibilização”, principalmente no que diz respeito ao artigo que exige a comprovação de autorização de uso do produto em seu país de origem. Querem que um produto cuja utilização é proibida na nação onde foi fabricado tenha seu uso liberado em solo gaúcho. Exemplo: um produto de alta toxidade e contaminação do meio ambiente já foi banido nos EUA, mas continua com seu uso liberado no resto do Brasil. O fabricante norte-americano exporta praticamente toda produção para nosso país, que ostenta a duvidosa posição de campeão mundial de consumo de agrotóxicos. E somente por conta da atual legislação é que o RS está protegido dos riscos do seu uso proibido em território riograndense.

A lei contempla cuidados com a saúde, com a produção de alimentos com qualidade e a defesa do meio ambiente, além de servir de elemento importante para a construção de uma visão de sustentabilidade que projetou o RS. É por causa da sua enorme importância, que propomos uma homenagem aos 30 anos de vigência da Lei nº 7.747 de 22/12/1982 e, a partir do ano que vem, uma Campanha de Divulgação e Promoção da Lei ao ingressar em sua quarta década em vigor.

Recentemente, me deparei, pelas redes sociais, com uma entrevista do economista André Lara Resende, um dos “pais do Plano Real”, que disparou a mesma tese de Gilding: ”temos que rever o que consideramos progresso”.Coincidência ou não, mas vindo de um dos formuladores da teoria de que, diante da evolução da crise econômica mundial, a saída era sustentar que somente a adoção de planos de austeridade seria capaz de acalmar os mercados, não deixa de ser uma enorme autocrítica, mas sobretudo uma grande e talvez fundamental novidade.

É claro que não devemos ser ingênuos. Rezende também escreve isso para demarcar com a visão desenvolvimentista, que defende que os governos façam fortes investimentos e dirijam os chamados “gastos públicos” para estimular o crescimento e o desenvolvimento, em curso hoje no Brasil. Que, aliás, foi fundamental para que pudéssemos atravessar ao menos em melhores condições que outros países, a crise mundial.

O que fez o criador do Real foi se ancorar na tese de Gilding, que propugna “a ruptura com a economia que conhecemos, do consumismo desenfreado, de um estilo de vida e de um modelo de desenvolvimento econômico que não medem o impacto nos recursos finitos do planeta”, qual seja, crescer a qualquer custo, mesmo que sem sustentabilidade.
O que talvez deve se ressaltar, aqui, é que ainda há margens significativas para aplicabilidade do modelo desenvolvimentista em países como o Brasil e outros, mas que, de fato, não existe mais nos chamados países centrais. Mesmo que exemplos sejam reducionistas, o Japão é um deles: não cresce há mais de 15 anos.

Portanto, a decorrência fundamental que devemos tirar da tese de Gilding, chancelada por Resende, é que mesmo com margem ainda para crescer, apostando somente nesta lógica, poderemos estar indo para o mesmo caminho dos países centrais e vamos esbarrar, sim, nos limites físicos do planeta. E como diz o economista, “a recusa de ver e agir em relação aos limites ecológicos, vai nos levar a um desordenamento e para um processo bem mais oneroso” do que se tivéssemos sidos capazes de nos preparar para abordar o desenvolvimento a partir de um novo ângulo e com sustentabilidade.

Portanto, o modelo sustentável é aquele em que o bem-estar passa pela inclusão, coesão social, renda, qualidade de vida, menor desigualdade, cuidado com as pessoas, com as cidades com os alimentos, com água, com energia renovável e a defesa do planeta. E não pela mera lógica desenfreada de consumo, com um fim nela mesmo.

É tempo de recuperar e atualizar a noção da nossa geração e das que nos seguirão acerca de por onde devemos caminhar. Precisamos redescobrir uma verdadeira consciência para um padrão de desenvolvimento de novo tipo, do contrário os limites físicos do planeta se excederão.
Ser contra a flexibilização da lei dos agrotóxicos é ser a favor do meio ambiente, da qualidade dos nossos alimentos, solos e água. Ser contra a alteração dessa lei é ser a favor de um novo modelo de desenvolvimento. É ser, portanto, a favor da própria vida.

E a recusa de ver e agir e mesmo a coragem de romper com o modelo de desenvolvimento produzido e reproduzido pela modernidade, poderá estar nos conduzindo, todos juntos, para a ante-sala do colapso do planeta e, portanto, para o mesmo naufrágio.

Adão Villaverde é engenheiro, professor, deputado, ex-presidente AL/RS


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