Brasil
descobre o sol como fonte de energia
Jornal do Comércio, dia 13/07/2015.
Na
primeira reportagem da série sobre recursos renováveis, o JC
Empresas & Negócios destaca o crescimento da geração que vai
além da hidreletricidade. Em um período de escassez hídrica, o
País volta os olhos para soluções alternativas e sustentáveis
Jefferson
Klein
A crise
energética que preocupa o Brasil também tem seu lado positivo. A
alta demanda em um período crítico levou o País a buscar novas
alternativas. Depois do fortalecimento da produção eólica, agora
quem surge com força e destaque é outra fonte renovável: a solar.
"Há aquele ditado que a dor ensina a gemer", lembra o
diretor da Siclo Consultoria em Energia Paulo Milano. O dirigente
ressalta que, em momentos de dificuldades, surgem ideias criativas.
O
especialista alerta que o desenvolvimento de novas fontes implica o
aumento de custos, que de alguma forma são repassados às tarifas de
energia. "Mas isso propicia que as pessoas acreditem em algo que
parecia improvável, e agora a bola da vez é a solar, todo mundo só
fala nessa energia", ressalta. Milano acrescenta que essa fonte
apresentava o obstáculo de ter um valor muito elevado de produção.
No entanto, o avanço da tecnologia e o ganho de escala estão
baixando o preço e tornando a opção viável.
O diretor
da Siclo salienta que a solar tem uma vantagem em relação à
eólica, outra fonte renovável que continua aumentando no Brasil,
que é o fato de ser mais confiável, sem sofrer tanta oscilação
quanto aos patamares de geração. Além disso, a instalação de
painéis solares pode ser feita em uma variedade maior de lugares do
que os aerogeradores.
O diretor
executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica
(Absolar), Rodrigo Lopes Sauaia, vê grandes oportunidades no setor.
"Se formos fazer a comparação com todas as outras fontes, a
solar é a que tem maior potencial em longo prazo", afirma o
dirigente. Conforme Sauaia, a energia solar seria suficiente para
atender à toda demanda de energia brasileira por muitos anos. Porém,
o dirigente admite que o papel dessa geração atualmente é
complementar.
Para o
integrante da Absolar, um dos motivos que atraiu os empreendedores e
o governo para a fonte solar foi a redução, em mais de 80%, do
custo dessa geração nos últimos 10 anos. Além da melhoria da
eficiência dos equipamentos, houve um ganho de produtividade com a
realocação do parque industrial do segmento para a Ásia. Sauaia
ressalta que o custo da energia solar depende de questões como o
tamanho da usina geradora, tecnologia empregada e região onde o
complexo está instalado. Mas, no primeiro e último leilão solar
realizado até agora, promovido pelo governo federal em outubro de
2014, foi contratada uma capacidade instalada de 1.048 MW (cerca de
25% da demanda média de energia elétrica do Rio Grande do Sul),
dividida por 31 projetos, com o preço-teto de R$ 262,00 o MWh. O
preço-médio, ao final da disputa, ficou em R$ 215,12 o MWh. A maior
parte da contratação corresponde a empreendimentos que serão
construídos na Bahia, São Paulo e Minas Gerais.
Para este
ano, Sauaia alerta que aspectos como variação cambial, dificuldades
da economia, aumento de impostos e elevação do custo de
financiamento no País vão pressionar o preço da energia solar para
cima. O diretor da Absolar enfatiza que esse cenário impactará
também as outras áreas de infraestrutura e, a longo prazo, a
perspectiva continua de redução dos custos. O dirigente recorda
que, para 2015, já está prevista a participação da fonte solar em
dois certames, um a ser realizado em agosto e outro em novembro.
Patamar
de 1 mil MW ao ano permitiria consolidação do setor
Para um
crescimento sustentável, como ocorreu com a eólica, os
empreendedores solares defendem que é preciso que o governo
brasileiro viabilize, através de leilões, a contratação de pelo
menos 1 mil MW solar anualmente. Essa tese é compartilhada entre o
diretor executivo da Absolar, Rodrigo Lopes Sauaia, e o diretor da
Conergy no Brasil, Eduardo Abreu.
"Uma
média dessa é necessária para que se tenha uma demanda básica que
justifique o investimento em fábricas no Brasil", sustenta
Sauaia. Abreu segue o raciocínio do integrante da Absolar e
acrescenta que nenhum fabricante de ponta de equipamentos de geração
solar está instalado atualmente no País, contudo, após o leilão
de 2014, alguns já demonstraram interesse. "A partir do próximo
ano, esperamos que um ou dois fabricantes estejam por aqui",
projeta.
Abreu
enfatiza que a energia solar é a sensação do momento. Entre os
motivos que explicam essa opinião, o executivo cita o fato de ser
uma geração modular, formada por um conjunto de painéis pequenos,
sendo possível produzir de forma distribuída, próximo ao ponto de
consumo. Essa característica diminui a chance de desperdício de
energia, com extravios na transmissão.
A Conergy
é uma empresa especializada no planejamento, financiamento,
construção e operação de sistemas solares de alto desempenho para
residências, empresas e projetos de larga escala em comércio e
indústria. A companhia tem no momento 50 MW em projetos licenciados
para concorrer em leilões, empreendimentos que serão desenvolvidos
no Nordeste. Na geração distribuída (de pequenos produtores), a
meta do grupo é atuar em todo o Brasil vendendo ou arrendando
instalações. Abreu informa que a companhia ainda não possui ações
no Rio Grande do Sul, mas estuda iniciativas no Estado.
Assim
como está despertando o interesse de grandes investidores, a energia
solar também atrai a atenção de pequenos empreendedores através
da chamada geração distribuída. A iniciativa consiste em um
consumidor instalar, por exemplo, um painel fotovoltaico em sua casa
ou empresa, gerar energia, atender a sua demanda e, por vezes, jogar
energia na rede elétrica e obter créditos com a distribuidora local
para diminuir a sua conta de luz. Vendo o potencial da ação, a
Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) analisa agora medidas
para incentivar ainda mais essa atividade.
O
executivo cita Porto Alegre como uma cidade que apresenta potencial
para clientes residenciais e comerciais para a produção de energia
solar distribuída. Segundo Abreu, em temos de irradiação, o
Nordeste brasileiro destaca-se. Porém, na questão da geração
distribuída, é preciso levar em conta na balança o preço da
tarifa de energia de cada estado. Regiões em que a conta da luz é
mais alta, como é o caso do Rio Grande do Sul em relação aos
nordestinos, começa a ficar mais vantajosa a instalação de painéis
fotovoltaicos nas residências. Usinas solar e eólica aproveitam
mesmo espaço
Se
complexos solares e eólicos podem ser considerados exemplos de
geração de energia sustentável e com menor impacto ambiental, o
que dizer quando estruturas dessa natureza coabitam o mesmo espaço?
O pequeno município pernambucano de Tacaratu, com menos de 30 mil
habitantes, vive uma experiência como essa.
Um parque
eólico, com capacidade instalada de 80 MW, começou a ser
implementado no local em 2013, pela italiana Enel Green Power. E, no
ano passado, um projeto solar do mesmo grupo venceu um leilão de
energia, dando condições da construção de um empreendimento, na
mesma área do parque eólico, de 11 MW. "A curiosidade é que a
unidade solar fica entre duas linhas de aerogeradores", reforça
o site manager da usina solar, Klaus Dal Pai Bohne. O dirigente
salienta que, com a medida, foi possível aproveitar a subestação e
linhas de transmissão já implementadas por causa da produção
eólica. A previsão é que as obras do complexo solar, que
absorverão cerca de US$ 18 milhões em investimentos, sejam
finalizadas até agosto.
Bohne
sugere como uma possibilidade de aproveitamento de área para a
geração de energia fotovoltaica a instalação de painéis
flutuantes em barragens. O dirigente reforça que, em contato com a
água, há uma refrigeração natural dos equipamentos, permitindo um
rendimento 20% superior às máquinas colocadas em terra. Outro lugar
adequado para iniciativas como essa são estacionamentos. Hoje, o
maior empreendimento solar desse tipo no Brasil encontra-se na sede
das empresas do grupo Enel, em Niterói (RJ). O projeto foi
desenvolvido pela Prátil, empresa de serviços do grupo Enel.
O
presidente da Prátil, Albino Motta, informa que o estacionamento
solar levou cerca de dois meses para ser construído e, desde o final
de 2014, está funcionando. A capacidade de geração de energia do
complexo é de 60 MWh por ano. Desde a sua inauguração, o projeto
alcançou a marca de 22 MWh de geração de energia solar, volume
suficiente para abastecer, ao mesmo tempo, cerca de 30 residências
com consumo médio de 155 KWh ao mês.
"Produzir
sua própria energia solar, além de contribuir para o meio ambiente
e para o sistema elétrico, é um investimento que se paga",
afirma Motta. Atualmente, a instalação de um sistema solar paga-se,
em média, entre cinco e oito anos, dependendo de variáveis, como,
por exemplo, o valor da tarifa praticado pelas distribuidoras ou o
índice de radiação solar da região onde o sistema será
instalado.
Custos
para soluções fotovoltaicas são bem variados
As
diversas possibilidades de produção de energia através do sol
fazem com que os gastos oscilem conforme o tamanho da geração que
se pretenda atingir. Segundo informações da Epi Energia Projetos e
Investimentos, os preços estão vinculados ao dólar e variam
bastante, sendo que um de menor porte pode ir de R$ 12 mil, para uma
casa com uma família de quatro pessoas, a mais de R$ 50 mil, para
uma grande residência. Um de maior porte, para o setor comercial ou
industrial, de 1 MW, pode alcançar um custo de mais de R$ 5 milhões.
A
diretora da Epi Energia Projetos e Investimentos, Annelise Dessoy,
acredita que a crise hídrica abre possibilidades para novas fontes
de energia. Uma prova disso é a intensa procura que a companhia tem
registrado pelos sistemas. A Epi, em dois meses, realizou mais de 400
orçamentos nos segmentos empresarial e residencial. No entanto,
Annelise diz que um dos problemas para essa área desenvolver-se mais
rapidamente é a falta de financiamentos atrativos e isenções de
impostos mais ousadas.
Lidio
Rauber, diretor executivo do Hospital Ana Nery, em Santa Cruz do Sul,
foi um consumidor que resolveu instalar um sistema fotovoltaico em
sua residência. Já na primeira conta de luz, ele percebeu uma
redução de cerca de 30%. Segundo ele, a projeção era de que o
investimento na instalação do equipamento (cerca de R$ 15 mil) se
pagasse em oito a 10 anos. "Mas, com essa alta da energia, deve
se pagar em menos tempo", prevê.
Fonte:
Jornal do Comércio, dia 13 de julho de 2015.
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